A política da linguagem e a linguagem da regressão política

A política da linguagem e a linguagem da regressão política

por James Petras

James Petras.O capitalismo e os seus defensores mantêm a dominação através dos “recursos materiais” sob o seu comando, especialmente o aparelho de estado, e suas empresas produtivas, financeiras e comerciais, bem como através da manipulação da consciência popular via ideólogos, jornalistas, académicos e publicitários que fabricam os argumentos e a linguagem para enquadrar as questões do dia.

Hoje as condições materiais para a vasta maioria dos trabalhadores deterioram-se drasticamente pois a classe capitalista descarrega todo o fardo da crise e da recuperação dos seus lucros sobre as costas das classes assalariadas. Um dos aspectos gritantes deste contínuo rebaixamento de padrões de vida é a ausência até agora de um grande levantamento social. A Grécia e a Espanha, com mais de 50% de desemprego na faixa etária dos 16-24 anos e aproximadamente 25% de desemprego geral, experimentaram uma dúzia de greves gerais e numerosos protestos nacionais com muitos milhões de pessoas; mais não provocou qualquer mudança real de regime ou de políticas. Os despedimentos em massa, os salários penosos, os cortes em pensões e serviços sociais continuam. Em outros países, como a Itália, França e Inglaterra, protestos e descontentamento manifestam-se na arena eleitoral, com governantes afastados e substituídos pela oposição tradicional. Mas no decorrer da agitação social e da profunda erosão sócio-económica das condições económicas e de vida, a ideologia dominante que informa os movimentos, sindicatos e oposição política é reformista: Apelos para defender benefícios sociais existentes, aumentar despesas públicas e investimentos, pela expansão do papel do estado onde a actividade do sector privados deixou de investir ou empregar. Por outras palavras, a esquerda propõe conservar um passado em que o capitalismo estava arreado com o estado previdência.

O problema é que este “capitalismo do passado” foi-se e um novo capitalismo mais virulento e intransigente emergiu forjando uma nova estrutura mundial e um poderoso aparelho de estado obstinado e imune a todos os apelos por “reforma” e reorientação. A confusão, frustração e má direcção da oposição popular de massa é, em parte, devido à adopção por escritores, jornalistas e académicos de esquerda dos conceitos e linguagem adoptados pelos seus adversários capitalistas: linguagem concebida para obscurecer as verdadeiras relações sociais de exploração brutal, o papel central das classes dominantes na reversão de ganhos sociais e as ligações profundas entre a classe capitalista e o estado. Publicitários, académicos e jornalistas elaboraram toda uma litania de conceitos e termos que perpetuam o domínio capitalista e desviam seus críticos e suas vítimas dos que perpetram o seu drástico deslizamento rumo ao empobrecimento em massa.

Mesmo quando formulam suas críticas e denúncias, os críticos do capitalismo utilizam a linguagem e os conceitos dos seus apologistas. Na medida em que a linguagem do capitalismo entrou no linguajar geral da esquerda, a classe capitalista estabeleceu a hegemonia ou dominação sobre os seus antigos adversários. Pior, a esquerda, ao combinar alguns dos conceitos básicos do capitalismo com a crítica aguda, cria ilusões acerca da possibilidade de reformar “o mercado” para servir objectivos populares. Isto faz com que falhe a identificação das ideias mestras das forças sociais que devem ser expulsas dos comandos da economia e do imperativo de desmantelar o estado dominado pela classe. Enquanto a esquerda denuncia a crise capitalista e os salvamentos do estado, a sua própria pobreza de pensamento mina o desenvolvimento da acção política de massa. Neste contexto a “linguagem” da ocultação torna-se uma “força material” – um veículo do poder capitalista, cuja utilização primária é desorientar e desarmar seus críticos intelectuais através do uso de termos, estruturas conceptuais e linguagem que dominam a discussão da crise capitalista.

Eufemismos chave ao serviço da ofensiva capitalista 

Os eufemismos têm um duplo significado: O que os termos implicam (connote) e o que eles realmente significam. Concepções eufemísticas sob o capitalismo implicam uma realidade favorável ou comportamento aceitável e actividade totalmente dissociada do engrandecimento da riqueza da elite e da concentração de poder e privilégio. Os eufemismos disfarçam o impulso das elites do poder para impor medidas específicas de classe e para reprimirsem serem adequadamente identificados, responsabilizados e opostos pela acção popular de massa.

O eufemismo mais comum é a palavra “mercado”, a qual é dotada de características e poderes humanos. Como tal, dizem-nos que “o mercado exige cortar salários” desligado da classe capitalista. Mercados, intercâmbio de mercadorias ou compra e venda de bens, têm existido há milhares de anos em diferentes sistemas sociais em contextos altamente diferenciados. Eles têm sido globais, nacionais, regionais e local. Envolvem diferentes actores sócio-económicos e compreendem unidades económicas muito diferentes, as quais vão desde casas comerciais gigantes promovidas pelo Estado até ao nível de aldeias camponesas de semi-subsistência e praças de cidades. Existiram “mercados” em todas as sociedades complexas: escravocratas, feudais, mercantis e em primitivas ou tardias sociedades capitalistas competitivas, monopolistas industriais e financeiras.

Ao discutir e analisar “mercados” e compreender as transacções (quem beneficia e quem perde), deve-se claramente identificar as classes sociais que dominam as transacções económicas. Escrever na generalidade acerca de “mercados” é enganoso porque os mercados não existem independentemente das relações sociais que definem o que é produzido e vendido, como é produzido e que configurações de classe modelam o comportamento dos produtores, vendedores e do trabalho. A realidade do mercado de hoje é definida por corporações e bancos multinacionais gigantescos, os quais dominam o trabalho e os mercados de commodities. Escrever de “mercados” como se operassem numa esfera acima e para além das brutais desigualdades de classe é esconder a essência das relações de classe contemporâneas.

Fundamental para qualquer entendimento, mas ignorado pela discussão contemporânea, é o poder incontestado dos proprietários capitalistas dos meios de produção e de distribuição, a propriedade capitalista da publicidade, os banqueiros capitalistas que concedem ou negam crédito e os responsáveis do estado nomeados pelos capitalistas que “regulamentam” ou desregulamentam relações de troca. Os resultados das suas políticas são atribuídos às eufemísticas exigências do “mercado” as quais parecem estar divorciadas da realidade brutal. Portanto, como insinuam os propagandistas, ir contra “o mercado” é opor-se ao intercâmbio de bens. Isto é claramente absurdo. Em contraste, identificar exigências capitalistas sobre o trabalho, incluindo reduções em salários, bem-estar e segurança, é confrontar uma forma exploradora específica de comportamento de mercado onde capitalistas procuram ganhar lucros mais altos contra os interesses e o bem-estar da maioria dos trabalhadores assalariados.

Ao confundirem relações de mercado exploradoras sob o capitalismo com mercados em geral, os ideólogos alcançam vários resultados: Eles disfarçam o papel principal dos capitalistas quando evocam uma instituição com conotações positivas, isto é, um “mercado” onde pessoas compram bens de consumo e “socializam-se” com amigos e conhecidos. Por outras palavras, quando “o mercado”, o qual é retratado como um amigo e benfeitor da sociedade, impõe políticas presumivelmente penosas é para o bem-estar da comunidade. Pelo é o que os propagandistas dos negócios querem que o público acredite ao mercadejarem sua virtuosa imagem do “mercado”; eles mascaram o comportamento predatório do capital na caça por maiores lucros.

Um dos eufemismos mais comuns lançado em meio a esta crise económica é “austeridade”, um termo utilizado para encobrir as duras realidades de cortes draconianos em salários, pensões e bem-estar público e o aumento drástico de impostos regressivos (IVA). Medidas de “austeridade” significam políticas para proteger e mesmo aumentar subsídios do estado a negócios, criar lucros mais altos para o capital e maiores desigualdades entre os 10% do topo e os 90% da base. “Austeridade” implica auto-disciplina, simplicidade, parcimónia, poupança, responsabilidade, limites em luxos e gastos supérfluos, evitar a satisfação imediata em benefício da segurança futura – uma espécie de calvinismo colectivo. A conotação da palavra é o sacrifício compartilhado hoje para bem-estar futuro de todos.

Contudo, na prática “austeridade” descreve políticas que são concebidas pela elite financeira para implementar reduções no padrão de vida de uma classe específica e em serviços sociais (tais como saúde e educação) disponíveis para trabalhadores e empregados assalariados. Significa que fundos públicos podem ser desviados numa extensão ainda maior para pagar altos juros a possuidores de títulos ricos enquanto sujeitam a política pública aos ditames dos senhores do capital financeiro.

Ao invés de falar de “austeridade”, com sua conotação de severa auto-disciplina, os críticos de esquerda deveriam descrever claramente as políticas da classe dominante contra o trabalho e as classes assalariadas, as quais aumentam desigualdades e concentram no topo ainda mais riqueza e poder. Políticas de “austeridade” são portanto uma expressão de como as classes dominantes utilizam o estado para comutar o fardo do custo da sua crise económica para cima do trabalho.

Os ideólogos das classes dominantes apropriaram-se de conceitos e termos, os quais a esquerda originalmente utilizou para o avanço de melhorias em padrões de vida e que se voltaram contra si. Dois destes eufemismos, tomados da esquerda, são “reforma” e “ajustamento estrutural”. “Reforma, durante muitos séculos, referia-se a mudanças, as quais diminuíam desigualdades e aumentavam a representação popular. “Reformas” eram mudanças positivas que promoviam o bem-estar público e a restrição do abuso de poder por regimes oligárquicos ou plutocráticos. Ao longo das últimas três décadas, contudo, importantes académicos, economistas, jornalistas e responsáveis da banca internacional subverteram o significado de “reforma” transformando-o no seu oposto: agora refere-se à eliminação de direitos do trabalho, ao fim da regulamentação pública do capital e à redução de subsídios públicos que tornavam a alimentação e o combustível acessíveis aos pobres. No vocabulário capitalista de hoje “reforma” significa reverter mudanças progressistas e restaurar os privilégios de monopólios privados. “Reforma” significa acabar com a segurança de emprego e facilitar despedimentos maciços de trabalhadores pelo rebaixamento ou eliminação da indemnização por despedimento. “Reforma” já não significa mudanças sociais positivas; agora significa reverter aquelas mudanças arduamente conquistas e restaurar o poder irrestrito do capital. Significa um retorno à fase primitiva e mais brutal do capital, antes de existirem organizações de trabalhadores e quando a luta de classe era suprimida. Portanto “reforma” agora significa restaurar privilégios, poder e lucro para os ricos.

De um modo semelhante, os cortesãos linguísticos da profissão económica puseram o termo “estrutural”, como em “ajustamento estrutural”, ao serviço do poder desenfreado do capital. Ainda na década de 1970 a mudança “estrutural” referia-se à redistribuição da terra dos grandes latifundiários para os destituídos de terra; uma mudança de poder dos plutocratas para as classes populares. “Estruturas” referia-se à organização do poder privado concentrado no estado e na economia. Hoje, contudo, “estrutura” refere-se às instituições e políticas públicas, as quais tiveram origem nas lutas do trabalho e da cidadania para proporcionar segurança social, para proteger o bem-estar, saúde e aposentação de trabalhadores. “Mudanças estruturais” são agora o eufemismo para esmagar aquelas instituições públicas, acabar com os constrangimentos ao comportamento predatório do capital e destruir a capacidade do trabalho para negociar, lutar ou preservar seus avanços sociais.

O termo “ajustamento”, como em “ajustamento estrutural” (AS), é em si próprio um eufemismo suave que implica sintonia fina, a modulação cuidadosa de instituições e políticas públicas que apoiam a saúde e o equilíbrio. Mas, na realidade, “ajustamento estrutural” representa um ataque frontal ao sector público e um desmantelamento geral de legislação protectora e de agências públicas organizadas para proteger o trabalho, o ambiente e os consumidores. “Ajustamento estrutural” mascara um assalto sistemático aos padrões de vida do povo em benefício da classe capitalista.

A classe capitalista tem cultivado uma safra de economistas e jornalistas que apregoam políticas brutais em linguagem suave, evasiva e enganosa a fim de neutralizar a oposição popular. Infelizmente, muito dos seus críticos “de esquerda” tendem a apoiar-se na mesma terminologia.

Dada a corrupção generalizada da linguagem, tão difusa nas discussões contemporâneas acerca da crise do capitalismo, a esquerda deveria cessar de se apoiar neste conjunto enganoso de eufemismos apropriados pela classe dominante. É frustrante ver quão facilmente as expressões seguintes entram no nosso discurso:

“Disciplina de mercado” – O eufemismo “disciplina” denota uma fortaleza de carácter séria e consciente em face de desafios em contraposição a comportamento irresponsável, escapista. Na realidade, quando vai a par com “mercado”, refere-se a capitalistas a aproveitarem-se de trabalhadores desempregados e utilizarem sua influência política e o poder de despedirem massas de trabalhadores e intimidar os empregados remanescentes para maior exploração e excesso de trabalho, produzindo portanto mais lucro por menos pagamento. Ela também cobre a capacidade de grandes senhores capitalistas elevarem sua taxa de lucro cortando os custos sociais de produção, tais como protecção ambiental e do trabalhador, cobertura de saúde e pensões.

“Choque de mercado” – Refere-se a capitalistas ocupados com maciços e abruptos despedimentos brutais, cortes em salários e eliminação de planos de saúde e pensões a fim de melhorar cotações de acções, aumentar lucros e assegurar maiores bónus para os patrões. Ao ligar o termo suave e neutro de “mercado” com “choque”, os apologistas do capital disfarçam a identidade dos responsáveis por tais medidas, suas consequências brutais e os imensos benefícios desfrutados pela elite.

“Exigências do mercado” – Esta frase eufemística é destinada a antropomorfizar uma categoria económica, afastar a crítica de proprietários reais de carne e osso, dos seus interesses de classe e do seu despótico estrangulamento do trabalho. Ao invés de “exigências de mercado”, a frase deveria ser lida: “a classe capitalista ordena aos trabalhadores que sacrifiquem seus próprios salários e saúde para assegurar mais lucro para as corporações multinacionais” – um conceito claro que provavelmente despertará a ira daqueles adversamente atingidos.

“Livre empresa” – Um eufemismo que é a combinação de dois conceitos reais: empresa privada para lucro privado e competição livre. Ao eliminar a imagem subjacente do ganho privado para os poucos contra o interesse dos muitos, os apologistas do capital inventaram um conceito que enfatiza as virtudes individuais de “empresa” e “liberdade” em oposição aos vícios económicos reais da cobiça e da exploração.

“Mercado livre” – Um eufemismo que implica competição livre, justa e igual em mercados não regulados encobrindo a realidade da dominação de mercado por monopólios e oligopólios dependentes de maciços salvamentos do estado em tempos de crise capitalista. “Livre” refere-se especificamente à ausência de regulamentações públicas e intervenção do estado para defender a segurança dos trabalhadores bem como a do consumidor e a protecção ambiental. Por outras palavras, “liberdade” mascara a destruição desumana da ordem cívica por capitalistas privados através do seu exercício desenfreado do poder económico e político. “Mercado livre” é o eufemismo para o domínio absoluto de capitalistas sobre os direitos e meios de vida de milhões de cidadãos, na essência uma verdadeira negação da liberdade.

“Recuperação económica” – Esta frase eufemística significa a recuperação de lucros pelas grandes corporações. Ela disfarça a ausência total de recuperação de padrões de vida para as classes trabalhadora e média, a reversão de benefícios sociais e as perdas económicas de detentores de hipotecas, devedores, os desempregados a longo prazo e proprietários de pequenos negócios em bancarrota. O que é encoberto na expressão “recuperação económica” é como a pauperização em massa se torna uma condição chave para a recuperação de lucros corporativos.

“Privatização” – O termo descreve a transferência de empresas públicas, habitualmente aquelas lucrativas, para capitalistas de grande escala privados, bem conectados, a preços bem abaixo do seu valor real, levando à perda de serviços públicos, emprego público estável e custos mais elevados para os consumidores pois os novos proprietários privados elevam preços e despedem trabalhadores – tudo em nome de outro eufemismo: “eficiência”.

“Eficiência” – Eficiência aqui refere-se apenas ao balanço de uma empresa; não reflecte os custos pesados da “privatização” arcados por sectores relacionados da economia. Exemplo: “privatizações” dos transportes aumentam custos de negócios a montante a jusante tornando-os menos competitivos em comparação com competidores em outros países; “privatização” elimina serviços em regiões que são menos lucrativas, levando ao colapso económico local e ao isolamento dos mercados nacionais. Frequentemente, responsáveis públicos, que estão alinhados com capitalistas privados, desinvestem deliberadamente em empresas públicas e nomeiam compadres políticos incompetentes como parte da política clientelista, a fim de degradar serviços e fomentar descontentamento público. Isto cria uma opinião pública favorável a “privatização” da empresa. Por outras palavras, a “privatização” não é um resultado das ineficiências inerentes das empresas públicas, como os ideólogos do capital gostam de argumentar, mas um acto político deliberado destinado o ganho do capital privado à custa do bem-estar público.

Conclusão 

Linguagem, conceitos e eufemismos são armas importantes na luta de classe “dos de cima” concebidos por jornalistas e economistas capitalistas para maximizar a riqueza e o poder do capital. Na medida em que críticos progressistas e de esquerda adoptam estes eufemismos e seu quadro de referência, as críticas e alternativas que propõem são limitadas pela retórica do capital. Colocar “aspas” em torno dos eufemismos pode ser um sinal de desaprovação mas isto não promove o quadro analítico diferente que é necessário para o êxito da luta de classe dos “de baixo”. Igualmente importante, deixa de lado a necessidade de uma ruptura fundamental com o sistema capitalista incluindo sua linguagem corrompida e seus conceitos enganosos. Os capitalistas subverteram em grande medida ganhos fundamentais da classe trabalhadora e estamos a cair outra vez em direcção ao domínio absoluto do capital. Isto deve relançar a questão de uma transformação socialista do estado, da economia e da estrutura de classe. Uma parte integral desse processo deve a rejeição total dos eufemismos utilizados pelos ideólogos capitalistas e a sua substituição sistemática por termos e conceitos que verdadeiramente reflictam a implacável realidade, que claramente identifiquem os perpetradores deste declínio e que definam as agências sociais para a transformação política.

18/Maio/2012

O original encontra-se em http://petras.lahaine.org/?p=1898 

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .

A GUERRA IMPERIALISTA E A REVOLUÇÃO

Declaração do Secretariado Internacional da 4ª Internacional sobre as ameaças de guerra na Síria e no Irã

A GUERRA IMPERIALISTA E A REVOLUÇÃO


1 de Março de 2012

As ameaças de guerra aumentam. As pressões para uma intervenção militar na Síria se multiplicam. Israel reafirma seu objetivo de bombardear o Irã a partir de abril.

Há um século, Lênin escrevia que a humanidade havia entrado no período histórico do “imperialismo, época de guerras e revoluções”. Mais do que nunca, a situação política mundial confirma totalmente a atualidade dessa afirmação.

O imperialismo está implicado diretamente na multiplicação em série de guerras — desde a primeira guerra do Golfo em 1991, destinada, segundo o presidente dos EUA, depois da desagregação da URSS, a inaugurar uma nova ordem mundial.

Em 1999, a Sérvia e Kosovo sofrem a intervenção militar da OTAN, última fase da guerra de desagregação da Iugoslávia iniciada nos anos 1990.

Em 2001, têm início os bombardeios ao Afeganistão, seguidos de ocupação militar. Em 2003, nova invasão do Afeganistão. Em 2011, a Líbia. E sem mencionar a ocupação militar do Haiti e dos múltiplos conflitos chamados «regionais», principalmente na África, alimentados pelo imperialismo.

O capitalismo, regime social agonizante, desencadeou uma verdadeira guerra contra os trabalhadores e os povos do mundo inteiro, uma guerra de desagregação das nações. Os trabalhadores e os povos, ao procurarem resistir à barbárie provocada pelo imperialismo, não têm outra saída a não ser avançar em direção à revolução emancipadora.

A “ordem” imperialista

Desde 21 de janeiro de 2011, frente aos acontecimentos revolucionários na Tunísia, a 4ª Internacional afirma que se trata de uma revolução proletária, não de uma pretensa “revolução árabe”. Esse processo revolucionário que, na região, se estendeu principalmente ao Egito, está batendo às portas da Europa. É a marcha mundial da revolução contra a “ordem” imperialista.

A crescente ameaça de guerra contra a Síria e o Irã procede dessa crise do capital. É o que mostra a crise de dominação política estadunidense, cuja ordem internacional foi desestabilizada pelos acontecimentos da revolução proletária na Tunísia e no Egito (e suas repercussões mundiais), e por sua própria crise de decomposição, elementos indissociáveis.

Para preservar a “ordem” imperialista mundial, seria necessário ao imperialismo estadunidense esmagar o planeta sob o tacão de ferro de uma ditadura de tipo fascista. Isso seria necessário tanto nos EUA como no resto do mundo, mas as condições não estão reunidas para chegar a esse ponto.

A classe dominante estadunidense tem sido incapaz de controlar sua própria crise (o 11 de setembro abriu uma nova fase) – uma crise que tem se aprofundado em proporções inéditas – e de operar uma reestruturação da ordem mundial sob seu controle. O que a leva a tentar fazer os demais imperialismos suportarem todos os efeitos de sua crise, provocando explosões em cadeia em todos os continentes, sem ter a capacidade de controlá-las.

As profundas consequências da crise generalizada do sistema de exploração capitalista – iniciada em 2008, no próprio coração do imperialismo, nos EUA, no que se chamou de crise dos “subprimes” – se materializam na crise de dominação do imperialismo estadunidense, que hoje se combina com os processos da revolução mundial em curso na Tunísia e no Egito; essa combinação explosiva serviu de detonador, em 2011, da crise durante muito tempo contida da União Europeia, abrindo a via para a aceleração de sua desagregação.

Neste momento, o imperialismo estadunidense dá outro passo na tomada do controle da União Europeia e de seus governos, através da introdução do FMI nos planos europeus (troika). Desse ponto de vista, as mobilizações dos trabalhadores europeus, quaisquer que sejam as formas da ação contra-revolucionárias dos aparelhos que dirigem o movimento operário para contê-las, se inscrevem nesse ascenso mundial da luta de classes contra o imperialismo.

Nos países europeus, para aplicar as exigências dos mercados, austeridade e desregulamentação, os governos – sejam de esquerda ou de direita – orientam-se para as “uniões nacionais” para impor esses planos aos povos. Para tanto, eles precisam atacar a independência das organizações sindicais e comprometê-las no acompanhamento desses planos. É o sentido da adoção, pelos países da União Europeia, em 1 e 2 de março, de um novo tratado europeu, destruidor de todos os direitos e garantias arrancados pela classe trabalhadora.

A guerra, uma condição necessária,

mas insuficiente

A revolução proletária na Tunísia e no Egito se ergueu claramente contra os regimes de Ben Ali e de Mubarak, mas também contra seus mestres: as potências imperialistas. Nessa medida, a revolução contribuiu poderosamente para desestabilizar “a ordem” estadunidense numa região em que o menor questionamento do equilíbrio existente ameaça as próprias condições da dominação imperialista em todo o mundo.

O significado da queda de Mubarak é internacional. De fato, o Egito ocupa um lugar especial na região. No final dos anos 1970, o acordo entre o aparelho militar que dirige o país e o imperialismo estadunidense desembocou na assinatura, em 1978, dos Acordos de Camp David, pretensamente «acordos de paz» com o Estado de Israel. Em troca de uma “paz” entre o Egito e o Estado de Israel, Camp David foi o ponto de partida para reforçar o encarceramento do povo palestino e sua redução a um povo pisoteado, com a cumplicidade da maioria dos governos dos países da Liga Árabe. Os acordos firmados em Camp David, nos EUA, sob a égide do governo estadunidense, foram os primeiros passos para o estabelecimento da dominação direta do imperialismo estadunidense nessa parte do globo (a maior região produtora de petróleo no mundo).

Os Acordos de Camp David tornaram possível a assinatura, em 1993, dos acordos de Oslo, os quais instituíram uma “Autoridade Palestina” nos territórios de Gaza e Cisjordânia que se comprometeu a garantir a “segurança” de Israel e a abandonar a carta da OLP cujo objetivo era uma só Palestina livre, laica e democrática, onde Judeus e Árabes poderiam viver em igualdade. Depois dos bombardeios e da segunda guerra contra o Iraque, desenvolveu-se a linha dos pretensos “dois Estados” nas terras históricas da Palestina. Mas o prosseguimento da mobilização do povo palestino, a recusa de renunciar à exigência do direito ao retorno para milhões de Palestinos que vivem fora da Palestina, demonstram a atualidade da revolução palestina.

É a partir daí que o governo estadunidense, tanto democrata como republicano, desenvolveu o que chamou de GMO (a política do “Grande Oriente Médio”).Com o GMO, o objetivo é desagregar o Oriente Médio e o Oriente Próximo, incluídos o Afeganistão e o Paquistão, e remodelar toda a região para garantir o controle estadunidense direto.

O “Grande Oriente Médio”, significa o questionamento das barreiras alfandegárias, a desagregação, a privatização e a instauração de um dispositivo militar sob o controle estadunidense. É a via para a qual foram empurrados o conjunto dos governos da região, instados a ir mais além nas “reformas”, por exigência do FMI. A Tunísia e o Egito, países cujos partidos dirigentes eram membros da Internacional Socialista, são os que mais avançaram nesse sentido, provocando a reação das populações.

A queda de Ben Ali e depois a de Mubarak colocaram em questão a realização desse plano. Para o imperialismo estadunidense, era necessário primeiro e urgentemente parar a onda revolucionária na região. Essa urgência exigia a guerra na Líbia. Foi organizada uma campanha de propaganda midiática que denunciava Kadafi e seu regime como “sanguinários”, coisa que ninguém ignorava, já que tanto os governos estadunidenses como os franceses e ingleses vinham sustentando esse regime e receberam Kadafi em seus países com todas as honras. Mas ele já não podia cumprir o papel que as grandes potências haviam lhe reservado.

Com os imperialismos, inglês e francês na linha de frente da execução, mas sob a direção do mestre estadunidense, o imperialismo providenciou a liquidação de Kadafi. Destruiu e desagregou a Líbia, “somalizada” de certa maneira, privada de toda soberania. Ao povo líbio foi negada toda possibilidade de expressar democraticamente sua vontade. Essa agressão anuncia o que o imperialismo prepara para Síria e, se for necessário, mais tarde, para o Irã.

Frente ao risco de propagação da onda revolucionária que pôs em questão os regimes ditatoriais da Tunísia e do Egito, era preciso barrar toda atividade independente das massas, desviá-la de seus objetivos, submetê-la ao controle do imperialismo e de seus instrumentos. Desse ponto de vista, a guerra na Líbia é uma ameaça direta contra os povos tunisianos e egípcios, mas também contra os demais povos.

Mas, se a guerra de agressão e de desagregação da Líbia era uma condição necessária para a defesa da “ordem” imperialista, ela não era suficiente.

A “transição democrática”

Para preservar os regimes que estavam sob as ordens do imperialismo, era preciso “renová-los” para manter o essencial, seus laços de subordinação. O imperialismo estadunidense, em nome da “democracia”, organizou a linha da “transição democrática”. O inimigo de ontem, o “islamismo”, se converte em aliado de hoje. Na Tunísia, o Nahda (Irmandade Muçulmana) constituiu um governo de união nacional com dois partidos laicos, dos quais um é membro da Internacional Socialista. No Marrocos, os partidos islâmicos integraram o governo depois das últimas eleições. O novo “governo” da Líbia propõe estabelecer uma legislação civil baseada na Sharia (código de regras religiosas, NdT). E, no Egito, a Irmandade Muçulmana fez um acordo com o exército. Lembremos que quando Mubarak caiu, o governo estadunidense declarou imediatamente sua disposição de reconhecer qualquer novo regime desde que fossem respeitados os tratados internacionais assinados pelo Egito. Naturalmente, referia-se aos Acordos de Camp David.

A resposta positiva do aparato militar egípcio não era suficiente para o imperialismo estadunidense, que seguiu pressionando até que a Irmandade Muçulmana – que sempre denunciara os Acordos de Camp David como uma traição – declarou que não questionaria tais acordos. A base de uma união nacional entre o exército e a Irmandade Muçulmana passou a existir, portanto, para grande satisfação do governo estadunidense.

O resultado dessa ofensiva do imperialismo estadunidense é a guerra que teve início em toda a região do Sahel [1]. A Líbia está desagregada, submetida a diferentes bandos mafiosos e milícias religiosas, tribais, etc. Os incidentes se multiplicam na fronteira entre a Tunísia e a Argélia, com milícias vindas da Líbia. Milhares de armas circulam na região. O Mali é hoje um país em guerra onde, por um lado, um exército dito de tuaregues e de mercenários vindos da Líbia quer a autonomia do Norte e, de outro lado do país, um movimento de guerrilha é mantido por um grupo da Al Qaeda. Em nome da “ajuda” ao exército do Mali, aviões estadunidenses bombardearam, em 4 de março, a região norte desse país.

A Argélia se vê particularmente ameaçada. País central do Magreb [2e também integrando o Sahel, seu governo não cedeu a inúmeras exigências imperialistas, retomando parcialmente o controle de sua economia e negando-se a integrar o dispositivo militar sob controle estadunidense. Esse país tem sido submetido desde então a uma campanha que tenta provocar uma “revolução”, o que no vocabulário imperialista significa “desagregação”.

Os “amigos da Síria”

É nessas condições que temos que compreender a realização, em 24 de fevereiro de 2012, de uma “Conferência dos Amigos da Síria”, que reuniu a maioria dos países da Liga Árabe e representantes do imperialismo francês, inglês e estadunidense. Uma delegação do Conselho Nacional Sírio (CNS) participou oficialmente dessa conferência. O CNS é um agrupamento de opositores que vivem principalmente no estrangeiro, que se reuniram na Turquia e fundaram o CNS como um “governo no exílio” ou “provisório” da Síria. Seus principais chefes estão ligados à Irmandade Muçulmana. A Conferência decidiu dar um primeiro passo para o reconhecimento do CNS e financiar as atividades do “Exército da Síria Livre”.

Foi seguindo precisamente esse mesmo roteiro que se reuniu em Paris, algumas semanas antes da intervenção na Líbia, uma “Conferência dos Amigos da Líbia” e colocou em marcha o reconhecimento do Conselho Nacional de Transição na Líbia. Não se trata da Síria. Trata-se da ordem mundial, cuja manutenção é cobrada da Síria e de seu povo.

Há décadas a Síria tem um papel importante na manutenção da ordem imperialista nessa parte do mundo, em particular com relação à Palestina. O regime instalado sob a tutela de Hafez al-Assad (pai de Bashar al-Assad) era parte constituinte do jogo entre o imperialismo estadunidense e a burocracia do Kremlin. Em 1976, foi o exército sírio quem liquidou, em um banho de sangue, os baluartes da revolução palestina no Líbano. Em 1991, a Síria é um dos Estados árabes que participam da primeira “cruzada mundial” contra o Iraque, sem deixar de se apresentar como o principal sustentáculo dos palestinos.

Depois da queda da URSS, a Síria foi obrigada a reajustar sua política mundial. O governo de Hafez al-Assad multiplica os atos de aproximação com o imperialismo.

O giro mais significativo foi a reação do governo sírio frente aos atentados de 11 de setembro de 2001 em Nova Iorque. O regime sírio, durante muito tempo colocado na lista dos “países terroristas” pelo governo dos EUA, denunciou o terrorismo. Em 2003, o governo sírio apoiou e ajudou a intervenção estadunidense no Iraque. Durante esse período, esse regime militar, que praticava uma demagogia “nacionalista árabe” e socializante, baseada numa intensa repressão política e numa política econômica protecionista que funcionava a base de subsídios, teve que dar um giro que se materializou na retirada das tropas sírias do Líbano, em 2005, e na realização de reformas econômicas exigidas pelo FMI. As privatizações, a alta dos preços e o fim dos subsídios mergulharam a grande maioria da população síria na miséria.

A existência de um Estado sírio centralizado, cujas decisões não dependem diretamente do imperialismo, com um papel essencial com relação ao Líbano, e que se nega a deixar o Irã isolado, parecia ser um fator de estabilidade. Mas, nas condições atuais, tal situação tornou-se contraditória com a política do imperialismo estadunidense tal como ela se materializou através da agressão contra a Líbia.

A política de submissão às exigências do FMI agravou as disparidades regionais internas, até então limitadas pelos subsídios do regime. O agravamento das disparidades regionais submeteu algumas regiões a uma miséria crescente. A cidade de Homs ilustra esse fato: terceira cidade do país viu dezenas de milhares de jovens camponeses expulsos de suas terras e transformados em desempregados nas cercanias da cidade, constituindo verdadeiras favelas, como a deBaba Amro, que foi onde recentemente ocorreram os combates mais violentos.

Esse giro do regime provocou em seu interior contradições intensas entre os que queriam ir mais fundo na colaboração com os EUA e os que se opunham a isso, provocando ajustes de contas e execuções.

Em tais condições de tensão, depois da queda de Ben Ali na Tunísia, em janeiro de 2011, o governo sírio anunciou que daria 11 dólares por mês às famílias mais pobres. Imediatamente, o FMI ordenou que a Síria abandonasse os subsídios para a alimentação. O FMI recomendou também que se aumentassem os preços da eletricidade, que continuavam baixos devido aos subsídios do Estado.

Essa situação reavivou os particularismos existentes, agravados por vários grupos e serviços secretos estrangeiros, além de alguns clãs que participavam do regime. A Síria é um mosaico de grupos religiosos e populacionais (sunitas, xiitas, alauítas, drusos, cristãos, árabes e curdos), preservado há meio século por um regime em que os dirigentes, principalmente os oficiais do exército, são da comunidade alauíta.

Frente às primeiras mobilizações que ocorreram na Síria, bem como em todo o Oriente Médio, o regime reagiu como sempre fez, reprimindo. Mas pelos processos revolucionários que se desenvolviam na Tunísia e no Egito, que conseguiram derrubar os ditadores no poder, a situação na região e internacionalmente já não era a mesma.

O povo sírio deve pagar a fatura

Em uma situação mundial e regional em que o imperialismo estadunidense não pode assistir impassível à marcha da revolução se chocando contra regimes ditatoriais em crise, que revelam sua debilidade, a ação de diferentes grupos ligados a países estrangeiros – a Irmandade Muçulmana, por muito tempo reprimida pelo regime, bem como a ação do Qatar e da Arábia Saudita a favor do imperialismo – provocou o desenvolvimento incontrolado de forças centrífugas.

Em um primeiro momento, repetindo o que fizera no passado, o imperialismo não denunciou a repressão. Ao contrário, pediu que o regime sírio se “reformasse”, ou seja, que se submetesse servilmente a todas as suas exigências.

O imperialismo, quando obrigado, é capaz de retroceder para salvar o essencial. Frente à mobilização revolucionária do povo egípcio que, conforme aumentava, mais profundamente era marcada pela ação da classe trabalhadora, o imperialismo, depois de pedir que Mubarak fizesse reformas, decidiu livrar-se dele, para tentar preservar o regime militar. A queda de Mubarak foi uma primeira vitória do povo egípcio contra esse regime militar e contra o imperialismo.

O imperialismo sabe sacrificar dirigentes e regimes para preservar o essencial – seu controle – frente à mobilização revolucionária de um povo. Também sabe – e tem longa prática nesse sentido – liquidar regimes com os quais cooperou por longo tempo, mas que se tornaram obstáculos à sua política.

O destino do regime de Basharal-Assad é hoje secundário para o imperialismo. A mobilização “humanitária”, o uso da ONU e da União Europeia, as sanções, são o prelúdio de uma nova agressão cuja meta, uma vez mais, seria destruir toda soberania de um Estado, desagregar uma nação, condená-la a uma cadeia sem fim de “conflitos étnicos”, “regionais” e religiosos. É o que está em curso hoje para a Síria. E mostra o que se prepara para o Irã amanhã.

Até há pouco tempo, portanto, sem deixar de denunciar formalmente a repressão, o imperialismo estadunidense pedia que o regime se “reformasse”. Depois, com o desenrolar dos acontecimentos, começou a prever a saída de Basharal-Assad, buscando uma solução para preservar, se possível, o regime militar na Síria, ou uma parte do aparato militar numa combinação de união nacional.

Mas existe uma diferença: a Síria não é o Egito. No Egito, foi a mobilização revolucionária das massas que derrubou Mubarak. Na Síria, desde as primeiras manifestações, o imperialismo e seus agentes intervieram para provocar a guerra civil. Dessa forma, ao constituir grupos militares que combatiam o exército do regime, impediram, desde as primeiras manifestações, toda mobilização popular.

O desencadeamento de uma guerra civil significa que o povo, preso entre dois fogos, fica soterrado, submetido à violência e à barbárie por todos os lados. É exatamente a repetição do que aconteceu na Líbia. Os serviços secretos atuam deliberadamente para provocar a guerra civil e utilizam as imagens dos combates para justificar a intervenção militar imperialista.

As contradições e as divisões na classe dominante estadunidense, os desacordos que vêm à tona sobre o Oriente Médio empurram à aventura. Alguns setores da classe dominante pedem a intervenção direta na Síria e apoiam a guerra que Israel quer lançar contra o Irã; outros hesitam, se opõem ou pedem tempo.

Para o imperialismo, a questão não é de direitos humanos, nem de democracia, nem dos direitos dos povos, mas da necessidade, frente à revolução, de preservar seu controle e é com essa perspectiva que julgam o regime sírio no poder.

Não à ingerência estrangeira,

não à guerra!

Essa ingerência imperialista, já em ação, e uma intervenção militar aberta provocariam a desagregação da Síria. De fato, dez anos depois da intervenção, o Iraque está desagregado, dividido entre zonas xiitas, sunitas e curdas, esta última quase autônoma.

A intervenção na Síria terá as mesmas consequências que na Líbia, também desagregada. Mas a Síria não é a Líbia. Tendo fronteiras como Iraque, Estado de Israel, Turquia e Líbano, a Síria tem pela sua história um lugar especial. A explosão desse país, mosaico cultural, linguístico e de povos terá repercussões imediatas sobre os países vizinhos. Que acontecerá com o território sírio povoado majoritariamente por curdos na fronteira com o território curdo iraquiano, quase autônomo? E os dois são vizinhos de territórios densamente povoados por curdos no sul da Turquia.

A ofensiva contra a Síria está ligada ao que se prepara contra o Irã. O bloqueio do Irã, empreendido pelas grandes potências há alguns meses, prepara, por sua vez, a desagregação do Irã. A ameaça de bombardeio desse país pelo Estado de Israel acelera esse processo. Mesmo se a Administração Obama tenta frear o Estado de Israel, seu objetivo é desagregar tanto a Síria como o Irã. Sua política provoca a desagregação das nações e dos Estados. Nenhuma zona da região pode escapar ao controle e à pilhagem do imperialismo.

Esse é o motivo de sua ofensiva contra a Síria e o Irã. Será a via aberta para novas violências, novas guerras, novas aventuras e a barbárie. Essa nova ofensiva que desagrega as nações constitui também um novo ataque ao povo palestino, cujo combate sem interrupção pelo seu direito à nação e, portanto, à terra da Palestina, há 60 anos, impede a «estabilização» da situação sob o controle imperialista. É significativo desse ponto de vista que, em Gaza, o Hamas ramo local da Irmandade Muçulmana egípcia – tenha se diferenciado do regime sírio, alinhando-se com as exigências do imperialismo, depois de ter aceitado o plano do quarteto (EUA, China, União Europeia e Russia) sobre a solução da questão palestina.

Mas essa região não é a única que está ameaçada. Todo o planeta pode sofrer as consequências desse incêndio. Em novembro de 2011, por iniciativa do Partido dos Trabalhadores da Argélia e da União Geral dos Trabalhadores Argelinos, uma Conferência de Emergência contra a guerra, a ocupação militar e a desagregação das nações, se reuniu em Argel. O Acordo Internacional dos Trabalhadores apoiou essa conferência. Delegações de militantes operários e democráticos de mais de 40 países adotaram uma resolução que diz:

“Condenamos os propósitos imperialistas de pilhagem dos recursos dos povos e de dominação que motivam essa intervenção [na Líbia – NdT].

Denunciamos essa intervenção que tem como um dos objetivos ameaçar os povos que lutam por seus direitos e sua soberania, que pretende lhes impor ‘um protetorado’ estrangeiro, tirando seu direito de dispor de seu presente e de seu futuro.

Denunciamos os planos das grandes potências, entre os quais o ‘Grande Oriente Médio estadunidense que busca desintegrar as nações em bases tribais, étnicas e religiosas com a finalidade de pilhar, oprimir (…)

Há uma situação de emergência quando as grandes potências preparam as condições para aguerra generalizada na região do Machrek [3], sempre negando os direitos históricos imprescritíveis do povo palestino, o direito ao retorno à sua terra para todos os refugiados, submetendo esse povo ao encarceramento em Gaza e na Cisjordânia, à repressão e às agressões.

Declaramos nosso total apoio às aspirações do povo sírio à democracia, à igualdade, mas condenamos veementemente as manobras e complôs das potências imperialistas e seus lacaios que instrumentalizam essas aspirações para fazer delas um pretexto para a intervenção militar estrangeira na Síria.

Opomo-nos a toda intervenção militar estrangeira em qualquer parte do mundo, portanto na Síria e no Irã, com ou sem aval da ONU (…)

Há uma situação de emergência quando as mesmas potências imperialistas e as instituições internacionais desencadeiam uma guerra social na Europa e nos EUA com planos de rigor assassinos para salvar os especuladores, os bancos e as empresas de previdência privada.

Há situação de emergência quando as grandes potências fazem da ingerência nos assuntos dos países um sistema mundial, outorgando-se o direito de dispor do destino das nações e dos povos”.

Essa declaração soa o alarme para todo o movimento operário mundial às vésperas de uma possível intervenção na Síria e no Irã. Em sentido oposto, os dirigentes da Internacional Socialista pedem uma intervenção militar. Partidos originados da crise dos PCs, principalmente na Europa (na América Latina, ao contrário, os partidos ligados ao castrismo ou originados nos PCs apoiam o regime de Bashar al-Assad) ou membros do Secretariado Unificado (SU) [4] declaram “apoiar o povo sírio” contra o regime. Dizem, da boca para fora, que não desejam uma intervenção militar do imperialismo. Mas pedem o armamento das milícias de opositores, o que alguns setores imperialistas já estão fazendo, por intermédio do Qatar. Milícias que, por sua vez, demandam claramente a intervenção militar estrangeira.

A 4ª Internacional considera que o primeiro inimigo das nações e de sua soberania é o imperialismo e que de nenhum modo se pode transigir na defesa dos povos contra o imperialismo.

A 4ª Internacional é pela revolução

A 4ª Internacional se mantém totalmente no terreno constitutivo do movimento operário desde o século 19, o da luta contra a guerra promovida pelas grandes potências. A 4ª Internacional, como fez em relação à Líbia, declara-se contra toda intervenção contra a Síria e o Irã, ainda que se faça sob a cobertura de pretextos humanitários.

Uma guerra na Síria provocará ainda mais mortes e sofrimentos para o povo sírio. Apoiar e ajudar o povo sírio é defender seu direito como nação a defender-se contra toda tentativa de desagregação, porque o quadro nacional é o quadro em que os povos podem se desfazer dos regimes subservientes às grandes potências imperialistas.

Ao contrário das “soluções” imperialistas, foi pela mobilização que os trabalhadores e os jovens da Tunísia, apoiando-se em sua organização sindical histórica, a UGTT, impediram, apesar dos numerosos mortos e feridos pela repressão de Ben Ali, que o país fosse empurrado para uma guerra civil e para a barbárie.

Ao contrário da Líbia, do Afeganistão e do Iraque, os trabalhadores na Tunísia, utilizando sua organização, a UGTT, através de greves e manifestações nas ruas, estiveram no centro da mobilização popular. Assim uniram todas as camadas do povo. Levantaram o povo contra a pequena minoria às ordens das potências estrangeiras. Essa revolução na Tunísia enfrenta obstáculos levantados pelo imperialismo e seus auxiliares. Obstáculos como a transformação da Constituinte em eleições legislativas e a formação de um governo de união nacional que é composto por um partido islâmico, um partido direitista e um partido membro da Internacional Socialista, que é submetido ao imperialismo e que ataca os trabalhadores e a UGTT.

Desse ponto de vista é significativa a manifestação ocorrida no dia seguinte à cúpula dos “Amigos da Síria”, na Tunísia, convocada para defender a UGTT, que durante várias semanas vinha sendo submetida a ataques e provocações. Manifestação numerosa, que reuniu tantas pessoas como quando da queda de Ben Ali, e cujo lema mais repetido era: “Nem Qatar, nem Estados Unidos!” Dois dias antes, a comissão administrativa da UGTT havia adotado uma moção que denunciava a ameaça de intervenção militar na Síria.

Esta questão é internacional: a existência de organizações da classe trabalhadora, principalmente os sindicatos, quadro elementar de organização dos trabalhadores, materializa, qualquer que seja a natureza dos aparelhos que dirigem a organização, que a sociedade está dividida em classes com interesses inconciliáveis. No Magreb, na Europa, nos EUA e em qualquer lugar, opor-se à política que compromete as organizações sindicais com a execução dos planos capitalistas é preservar o marco da luta da classe operária contra o capital.

Opor-se à ação dos aparelhos dirigentes do movimento operário que queiram acompanhar esses planos, significa ajudar a classe trabalhadora a derrubar os obstáculos levantados no caminho de sua mobilização.

É pela mobilização dos trabalhadores em seu próprio terreno, com suas reivindicações, levantando-se necessariamente contra a subordinação ao imperialismo e às suas exigências que pode ser defendida a soberania da nação, quer dizer, do povo livre e independente, por meio da ruptura de todos os laços de sujeição às potências imperialistas.

O único caminho para a paz, a democracia, a liberdade e a independência nacional é o da mobilização das massas em defesa de suas reivindicações, cujo conteúdo econômico, social, operário é inseparável das reivindicações democráticas que se chocam contra os regimes que agem como correias de transmissão do imperialismo.

O objetivo da 4ª Internacional não é “reformar” ou “humanizar” o regime imperialista mas derrubá-lo. Esse é o sentido da oposição resoluta da 4ª Internacional às ameaças de guerra contra a Síria e o Irã e de seu apoio incondicional ao combate dos povos por sua emancipação social e nacional, como procuram realizar os povos da Tunísia, do Egito, do conjunto da região, da Europa e do mundo inteiro.

Abaixo a guerra, abaixo a exploração” é a palavra de ordem do futuro e da preservação da humanidade.

ANEXO

A conferência dos “Amigos da Síria” acaba de se realizar na Tunísia, convocada pela Liga Árabe, instigada pelos imperialismos estadunidense e da União Europeia. Uma questão se coloca imediatamente: pode-se pensar, sinceramente, que os principais promotores de guerras do planeta se interessam pelo bem estar dos povos? Essa conferência decidiu enviar ajuda militar a vários grupos de opositores ao regime de Bashar al-Assad. Paralelamente à reunião oficial, o semanário francês Le Canard Enchaîné (29 de fevereiro) informou sobre uma reunião de vários serviços secretos para avaliar a possibilidade de organizar um golpe de Estado em Damasco. Como se vê, a situação na Síria é uma questão essencialmente internacional e a formidável campanha midiática atual nos incita a analisar a situação com base nos fatos.

1 – O lugar atual da Síria no Oriente Médio

Em 2008, o Presidente Bashar al-Assad visita a França, para participar da reunião da União para o Mediterrâneo e é recebido por Nicolas Sarkozy, que agindo sob orientação de Washington, procura debilitar a aliança entre a Síria e o Irã. Essa reunião suspende uma longa quarentena a que a Siria estava submetida e foi acompanhada da aceleração de uma política de abertura econômica, portanto de privatizações, desejada pelo regime. A privatização do sistema econômico sírio aprofundou a miséria, na última década, de uma franja importante da população pobre, agravando ao mesmo tempo a corrupção dos grupos vinculados ao poder, que pretendem monopolizar o resultado das privatizações.

Entretanto, é necessário saber que essa miséria afeta também a componente alauíta, da qual se origina a família Assad. Numerosos grupos alauítas vivem na miséria, como os taudis, que se encontramna periferia de Damasco, ou estão em povoados pobresna região costeira onde a regra geral é o desemprego ou o “trabalho informal”. No grupo sunita, majoritário, em que os grandes comerciantes sempre souberam obter benefícios de sua aliança com o regime, os ressentimentos se exacerbaram contra os alauítas apresentados como privilegiados por alguns líderes religiosos. A agitação fomentada pela Irmandade Muçulmana, vinculada à Arábia Saudita e Turquia (que seguem a mesma observância religiosa), tem como objetivo dar um conteúdo religioso ao conflito, se opondo principalmente aos alauítas, seita muçulmana xiita, cuja observância e tradições os tornam mais próximos do Irã. Essas dissensões – aqui sumariamente mencionadas e que têm origem na história colonial do país – são hoje utilizadas por todos os beligerantes para desviar os movimentos de revolta, de protesto e também para orientar a repressão e as provocações no território sírio.

Em março de 2011, no momento em que se desencadearam vários movimentos de protesto, cerca de 10% da população vivia abaixo da linha de pobreza, com uma taxa de desemprego, principalmente entre os jovens, de 30%. Paralelamente ao desenvolvimento da miséria, percebe-se na Síria um aumento do investimento de grupos religiosos nos setores da assistência social, saúde e educação, bem como a construção de mesquitas, graças à Arábia Saudita, em regiões tradicionalmente curdas ou cristãs, tudo isso tolerado pelo regime. Segundo uma obra publicada em janeiro de 2011, “a demografia galopante – cerca de 42% da população tem menos de 15 anos – o desemprego, a inflação e a diminuição drástica dos subsídios para os bens de primeira necessidade pioraram os dados de uma equação social cuja ‘gestão política poderia se tornar arriscada’ como considerava o chefe do posto econômico de uma embaixada europeia”.

No início de janeiro de 2011, no momento em que a revolução na Tunísia expulsava do poder Ben Ali, o governo sírio anunciou que pagaria 11 dólares por mês para as famílias mais pobres do país. Mas o FMI ordena que a Síria abandone imediatamente os subsídios para a alimentação. As “reestruturações” econômicas (para fomentar os investimentos estrangeiros) provocam paralelamente descompromisso do Estado em relação aos subsídios e à assistência social levando, portanto, ao aprofundamento da miséria.

De acordo com The Economist (20 de janeiro de 2011), “durante os últimos 5 anos, procurou-se colocar em questão a ideologia socialista e substituí-la pela ideologia de mercado”, diz um conselheiro do GovernoTratarão de aplicá-la nos 5 anos vindouros. Isso significa cortes diretos nos subsídios e dolorosas medidas de austeridade para as massas sírias que já não são ricas. Mas, terá o governo, que vê as desordens sociais aumentarem na região como consequência do levante na Tunísia, força suficiente para não retroceder (…)? No último período, temendo desordens sociais, o governo vacilou. Anunciou um aumento de 72% dos subsídios para o combustível doméstico para os servidores públicos e congelou o preço da eletricidade. Mas necessita dinheiro. As rendas do petróleo caíram enquanto a população duplicou, atingiu, desde a metade dos anos oitenta, cerca de 22 milhões de habitantes e continua aumentando. O governo já não pode adiar mais suas reformas (…). Há anos que o FMI pede à Síria que acabe com os subsídios. Em 2008, o governo deu um grande passo junto com seus homólogos da região, principalmente o Egito, ao aumentar o preço da gasolina. Pôs fim aos subsídios para os fertilizantes, mas os conservou para outros setores, inclusive a eletricidade e alimentação que continuam sendo artificialmente baratos. Os subsídios diretos para a energia custam ainda à Síria cerca de 5% do PIB por ano, segundo o governo e o FMI”.

Antes do início do movimento de protesto, o regime sírio tinha se comprometido, em negociações com os estadunidenses e os sauditas, a estabelecer uma reforma baseada nos “ajustes estruturais” e a colocar em pauta o abandono de sua aliança histórica com o Irã e a promessa de paz com Israel. Em contrapartida, a Síria pedia a recuperação das colinas de Golan (anexadas pelo Estado de Israel desde 1982), que os israelenses não estão dispostos a aceitar.

As reivindicações de “reformas” democráticas se dividem entre os que reivindicam a manutenção das nacionalizações e a propriedade de Estado, produto da história do baasismo (ideologia socializante e nacionalista da qual vinha Hafez al-Assad, pai do atual presidente), e os que esperam mais privatizações e a liberalização da economia com a ilusão de que essa abertura poderia permitir a todos fazer “bons negócios” segundo a propaganda inerente ao capitalismo.

Expressão, ao mesmo tempo, de um inegável movimento popular, de uma repressão implacável, de manipulações e provocações, o que está em jogo na situação da Síria ultrapassa amplamente o marco nacional sírio.

2 – Em que a Síria se inclui no ascenso revolucionário que explode em 2011 e que o imperialismo pretende represar por todos os meios?

Diferentes análises colocam de imediato que a maioria das manifestações populares em março, abril, maio, agrupavam amplamente todos os componentes “étnicos” da sociedade síria e se caracterizavam por reivindicações de unidade da Síria, contra a guerra civil (o Líbano vizinho e a guerra no Iraque com mais de um milhão de refugiados deslocados para a Síria são um exemplo terrível para a população síria), vinculadas a reivindicações contra o regime policial, contra a corrupção. Fica claro que o povo sírio, como todos os povos, quer pão, terra e liberdade. É primeiramente nesse sentido que se realizaram manifestações em várias cidades do país.

Um ano de conflito interno, uma oposição dividida (e que continua a se dividir, já que a conferência na Tunísia em 24 de fevereiro produziu uma nova cisão no CNS) e baseada em objetivos contraditórios, a ausência de todo movimento operário independente, uma situação na qual tudo leva a crer que o regime não poderá ser derrubado sem intervenção exterior não são as marcas de uma revolução popular, o que não retira em nada a legitimidade das reivindicações democráticas, cujo conteúdo questiona tanto o regime policial como os reformadores pró-imperialistas. Podemos assim afirmar que não há uma revolução na Síria, mas um processo de desestabilização que, contra a vontade das massas, pretende manipulá-lase às suas reivindicações democráticas.

Desde o início do movimento, vários especialistas insistem no caráter popular inédito do levante, como Rime Allaf no diário francês Liberation, em 26 de março de 2011, que, sem responder à questão de saber se assistimos ou não a uma revolução, esclarece que “o poder sírio hoje já não é somente um poder alauítaÉ o poder de um homem, Bashar al-Assad e seus auxiliares. A Síria mudou muito desde a década de 1990. As burguesias sunitas e alauitas de Damasco ou Alep se misturaram. Hoje, os sírios se rebelam juntos independentemente de separações comunitárias. Isso é ainda mais evidente entre os jovens formados e sem trabalho (…). A Síria é, depois da Tunísia, um dos países árabes com a juventude mais educada e mais numerosa. »

Sem questionar tais informações, outros analistas, como Camille Otrajki, mencionam uma situação turva, aberta a todas as manipulações. O New Times de 23 de abril de 2011 considera que “ali onde outros consideram que se trata de uma ação coordenada, Camille Otrajki vê uma manipulação explicando que a utilização de imagens pelos militantes tem por objetivo ocultar o fato de que a revolta é mais sectária (no sentido religioso) que nacional e que ela ignora o temor das minorias. Chamo isso de mentira, acrescenta o Sr. Otrajki, uma voz isolada no tumulto da rede. “É como colocar num produto uma etiqueta que não tem nada a ver com o conteúdo. É uma manipulação”.

Deve-se notar que para corroborar o que acaba de se dizer, segundo um correspondente de A Verdade consultado por telefone no início de novembro de 2011, “nunca se viu tantas armas circularem na SíriaDe onde vieram? Ninguém sabe dizer. Antes do início da crise política, ninguém tinha arma de fogo. Será que se pretende incitar os sírios a matarem uns aos outros, levá-los à guerra civil como na Líbia? Os sírios estão inquietos, por isso uma maioria apoia o regime. Não necessariamente a política de Bashar, mas a unidade nacional. Depois do exemplo líbio, se refuta amplamente a perspectiva de uma intervenção estrangeira da OTAN”. Além disso, a debilidade histórica do movimento operário organizado na Síria, terrivelmente reprimido nos dez primeiros anos do regime de Hafez al-Assad, bem como a submissão da maioria dos grupos opositores à Arábia Saudita, Qatar e os EUA torna toda expressão independente – tanto no interior do país, como no exterior – problemática, o que não significa dizer que grupos independentes não surjam nesse movimento complexo.

Já em março de 2011, o imperialismo tentou instrumentalizar o movimento de rebelião, tal como ocorreu na Líbia, informa a coluna de Elliot Abrams, antigo conselheiro de Georges W. Bush para o Oriente Médio, publicada no jornalWashington Post, em 26 de março de 2011. Abrams, conhecido por ser “muy amigo” do povo árabe, elabora aqui o plano de intervenção seguido pelo imperialismo nos meses seguintes: foi ordenado à Tunísia e Egito que convocassem uma reunião da Liga Árabe sobre o tema; referiu-se às medidas econômicas adotadas contra a Líbia de Kadafi antes da intervenção militar da OTAN, para debilitar Assad e reforçar a oposição; defendeu desde o início a opção militar contra a Síria. Orientados pela defesa dos mesmos interesses, os antigos Secretários de Estado estadunidenses Henri Kissinger e James Baker formularam o problema de modo diferente no mesmo jornalWashington Post (9 de abril de 2011) colocando o objetivo de trabalhar diretamente com governos islâmicos para canalizar e represar todo o processo revolucionário: “Para nós, a estabilidade, no longo prazo, no golfo árabe-persa, onde se encontram numerosas fontes energéticas mundiais, representa um interesse vital. Do mesmo modo, é do maior interesse para nós garantir que os países da região não se convertam em um viveiro de extremistas islâmicos (…). É necessário que os EUA continuem uma política que combine nossa vontade de proteger nossos interesses nacionais com a promoção dos valores que fizeram a grandeza de nosso país, a democracia, a liberdade e os direitos humanos. Essa política de idealismo pragmático é a melhor maneira de fazer frente aos desafios e às possibilidades oferecidos pela transformação capital que se desenvolve no mundo islâmico. »

Se a pressão a favor de uma intervenção militar existe nas cúpulas do imperialismo, ela não é unânime. Mas a incapacidade da oposição oficial de derrubar o clã no poder pode fazer com que a opção da intervenção esteja na ordem do dia e seja acelerada. Como nota um antigo embaixador egípcio na Síria no diário argelino Al-Khabar (20 de fevereiro de 2012): “O verdadeiro conflito não está entre o regime de Bashar al-Assad e o Exército da Síria Livre, mas entre alguns países ocidentais, à frente dos quais estão os EUA e Turquia, que desejam criar uma nova ordem regional para dissuadir o Irã e destruir a Síria”. A Rússia, que joga seu lugar no Oriente Médio, e a China, que foi expulsa da Líbia com a queda de Kadafi, explicitam sua oposição a toda intervenção militar e se declaram partidárias de uma reforma interna do regime que debilitaria a posição estadunidense e da Turquia, principal base militar da OTAN na região.

Para os Obama–Sarkozy, e também para os dirigentes russos e chineses, na Síria como em toda parte, não é a natureza repressiva e corrompida do regime que está em questão, mas sua capacidade de manter a ordem e de se inserir no “mercado mundial”. Nesse plano, o peão Bashar al-Assad está sendo rechaçado por uma parte de seus antigos apoiadores. Frente à revolução na Tunísia e o processo revolucionário egípcio, o imperialismo, debilitado, procura se manter mas calcula, o tempo todo, o alcance que teria uma desestabilização da Síria. Mas a Caixa de Pandora já está aberta, a tal ponto que James Clapper, chefe da Inteligência Nacional estadunidense, se alarma porque grupos não controlados, classificados como Al-Qaida da Mesopotâmia, conseguiram “infiltrar os grupos de oposição” que “em numerosos casos não estão informados de sua presença” (AFP, 16 de fevereiro). Para Clapper, continua a nota, “o problema é que os grupos que tomaram as armas contra o regime sírio estão fragmentados(…) Não existe movimento nacional (…) O Exército da Síria Livre (ESL), que não passa de um nome genérico para designar os opositores do regime, não está unido. Há lutas internas para determinar quem irá dirigi-lo”.

Em 1926, analisando as relações entre o imperialismo estadunidense e o resto do mundo, Leon Trotsky indicava que “a potência dos EUA é precisamente seu ponto vulnerável: implica na sua dependência crescente com relação a países e continentes politicamente instáveis”. Além disso, para estabelecer sua soberania, o imperialismo procura por todos os meios impedir o processo de decomposição social das classes dominantes a ele vinculadas, o que não faz mais que aumentar as fraturas sociais e agravar a luta de classes. As contradições que o imperialismo enfrenta estão intimamente ligadas e causam guerras, caos, rebeliões por toda parte onde ele intervém.

O imperialismo pretende abertamente apoiar-se, como vimos, em grupos religiosos até há pouco designados como parte do “eixo do mal”, como a Irmandade Muçulmana, no poder no Egito, parcialmente na Tunísia e também na Turquia (o modelo turco), com o objetivo de suprimir os movimentos populares, estabelecer “reformas” econômicas – ou seja, continuar com os planos de “ajustes estruturais” – e combater os grupos mais radicais abertamente antiocidentais.

De acordo com o escritor palestino Adel Adbul Rahman (diário Al-Hayat al-Jadidah, 22 de junho de 2011): “O objetivo estadunidense, que fundamenta a importância outorgada às relações com a organização Irmandade Muçulmana (…) vai muito mais longe. Em primeiro lugar, como Israel, os EUA querem favorecer o papel desempenhado pelos grupos islâmicos moderados entre todos os componentes da nova ordem política, com a finalidade de bloquear os grupos fundamentalistas extremistas. Em segundo lugar, querem atiçar os conflitos internos nesses Estados árabes para liquidar os objetivos das revoluções árabes, ou seja, a construção de Estados laicos por todos os cidadãos. Em terceiro lugar, se propõem introduzir dissensões na sociedade dos países árabes, principalmente porque os grupos religiosos árabes continuam negando e são incapazes de aceitar a participação de outros grupos políticos, sociais e religiosos, ainda que persistam em declarar ante os estadunidenses e europeus sua vontade de comprometer-se em parcerias políticas! Em quarto lugar, à luz do dito mais acima, querem preparar o terreno para que esses países se dividam em mini estados antagônicos, o que finalmente favoreceria o objetivo do Novo Oriente Médio. Isso foi confirmado por um dos responsáveis da Irmandade Muçulmana na Palestina, no final de maio, quando disse: “Agora a via se abre para nós com a Irmandade Muçulmana. Quem se opuser ao nosso movimento será esmagado sem piedade (…). Podemos fazer tudo o que quisermos e, quando a comunidade da Irmandade Muçulmano chegar ao poder, o mundo inteiro mudará”. Esse membro da organização Irmandade Muçulmana acrescenta sem constrangimento: “A Síria e Jordânia serão os próximos. Nós controlaremos o mundo árabe porque é o que querem os estrangeiros (…)”.

Mas a posição estadunidense é instável, vacilante, daí o prolongamento da crise que já perdura há um ano. Isso se explica pelo papel tradicional desempenhado pelo regime sírio, elemento da ordem imperialista na região, “melhor inimigo” do Estado de Israel, controlando o Hezbolá libanês, bem como a maioria das facções palestinas, e não vacilando em instrumentalizá-las segundo suas necessidades.

3 – Repressão e

contrarrevolução na Síria

A Síria não é a Líbia. Menor em superfície é também muito mais povoada (23 milhões de habitantes contra 6 milhões na Líbia) e dotada de um exército estruturado e, ainda, em grande medida, disciplinado. Esses elementos, como vimos, levam os estrategistas da OTAN, principalmente os estadunidenses, a discutirem a possibilidade de uma intervenção, cujos choques poderiam desequilibrar ainda mais o Estado de Israel, já debilitado pelo movimento revolucionário no Egito. No centro dos temores estadunidenses, existe também a preocupação de evitar todo “transbordamento popular” que poderia comprometer não apenas a natureza social do regime, mas, sobretudo todos os acordos firmados e o equilíbrio regional.

No momento em que escrevemos, a conferência dos autoproclamados “Amigos da Síria” acaba de se realizar na Tunísia, ou seja, utilizando a imagem simbólica das “revoluções árabes”. Decidiram fornecer armas e meios logísticos aos insurretos para reforçar, em permanência, a capacidade dos grupos armados em desestabilizar o regime com a implementação de uma guerra civil.

A Liga Árabe, presidida atualmente pelo Qatar – micro Estado com regime obscurantista, que tem a particularidade de possuir a terceira reserva mundial de gás – nunca foi tão ativa para resolver o problema interno de um país membro. O objetivo de isolar o regime sírio acusando-o, unilateralmente, de atos de crueldade contra os civis, principalmente nas cidades onde se entrincheiraram os grupos armados do ESL, não escapa a contradições quando confrontado à realidade. A liga árabe organizou, a pedido do imperialismo, uma missão de observadores, entre 24 de dezembro de 2011 e 18 de janeiro de 2012, cujo relatório, em vários pontos,registra atos de violência cometidos por grupos armados contra as forças governamentais e civis (ponto27, principalmente), e onde vários testemunhos informam sobre explosões e atos de violência que se revelaram falsos. Enterraram rapidamente esse relatório. De seu lado, os atentados por carro-bomba, método até então desconhecido na Síria, teriam origem, segundo alguns, na incapacidade militar dos opositores, particularmente do “Exército da Síria Livre”, em debilitar a coesão das forças militares que continuam em grande medida vinculadas ao regime; para a oposição, o surgimento de tais atentados seria uma manipulação política do poder existente.

Segundo a ONU e várias associações humanitárias, a repressão teria feito mais de 6.000 vítimas desde o início do movimento entre os opositores e de 1.500 a 2.500 entre as forças vinculadas ao regime. Se não nos cabe discutir estes números – que são o reflexo da brutalidade do conflito e dos dirigentes de ambos os lados – convém assinalar que a cobertura midiática da repressão na Síria é retransmitida essencialmente pelas emissoras Al-Jazira e Al-Arabiya, que pertencem, respectivamente, às famílias reinantes no Qatar e Arábia Saudita e que mantiveram silêncio total sobre a repressão das manifestações no Bahrein.

Segundo o diário britânico The Guardian (17 de novembro de 2011), “a imagem de um regime que dispara contra manifestantes sem armas, e que correspondia à realidade em março e abril deste ano, envelheceuO pretenso “Exército da Síria Livre” já não dissimula o fato de que combate e mata as forças governamentais e a polícia e que opera a partir de lugares protegidos, fora das fronteiras da Síria. Se reforçada, a guerra civil, que está em seu início, poderá se aprofundar e se tornar, numa reviravolta, mais abertamente sectária, aumentando o risco de perseguição contra comunidades rivais. Os sunitas moderados da Síria se preocupam pelo ativismo crescente da Irmandade Muçulmana e dos Salafistas que assumiram um papel dirigente nas fileiras da oposição. É impossível considerar que as amplas manifestações favoráveis ao regime que ocorreram em Damasco e Alep na semana passada somente seriam compostas de pessoas que participaram sob a ameaça de perder seu emprego, se não fossem às ruas. Enquanto isso, a importante minoria cristã da Síria se esconde, temendo sofrer o mesmo destino que os cristãos no Iraque que se viram obrigados a fugir quando confrontados ao fato de que sua opção religiosa poderia torná-los alvo de matanças e que os atentados começavam também a mirar os não muçulmanos. No norte da Síria, os curdos se preocupam também com o futuro. Apesar da negativa de sempre do regime de aceitar reconhecer seus direitos nacionais, a maioria deles temem ainda mais a Irmandade Muçulmana”.

 

4 – O que é a oposição síria?

Convém aqui fazer um balanço dos distintos componentes da oposição ao regime. O Conselho Nacional Sírio, majoritariamente composto por membros do ramo sírio da Irmandade Muçulmana, é dirigida por um universitário francês, de origem síria, cobertura laica e democrática. Constituído com o apoio da França, da União Europeia, no modelo do CNT líbio, sua sede está na Turquia. Devemos assinalar que o CNS, que continua negando a participação em sua direção de qualquer militante de origem curda, acaba de aceitar, em 26 de fevereiro, após prévio pedido estadunidense, a participação de um membro alauíta. A proximidade entre o CNS e o governo turco é explicada pelo fato de o AKP (partido no poder na Turquia) ser, ele mesmo um ramo da Irmandade Muçulmana, cuja casa matriz, no Egito acaba de declarar que reconhecia os acordos de paz de Camp David, assinados entre o Egito e o Estado de Israel. A Turquia, que pretende desempenhar um papel regional de primeiro plano (entenda-se, ser o primeiro elo da política estadunidense no Oriente Médio, à frente da Arábia Saudita e do Egito), acolhe também em seu território bases externas do “Exército da Síria Livre”, cuja formação permitiu. A legitimidade do ESL é tão contestada que vários grupos armados também se constituíram em exércitos de libertação com nomes diferentes.

Se o caráter repressivo e mafioso do regime sírio dirigido por Bashar al-Assad não é novidade, a perspectiva de uma desagregação do país através de uma intervenção militar se vê confrontada à esmagadora maioria do povo sírio, independentemente de confissões religiosas, longe dos cálculos políticos dos representantes locais da OTAN, dos EUA e da União Europeia. Esse elemento inevitável abala as próprias bases de uma oposição exterior, essencialmente baseada sobre o princípio da intervenção. Um ano depois do início dos distúrbios, continua difícil conhecer o ponto de vista do “povo sírio”, a não ser sua oposição maciça a qualquer forma de ingerência externa. Mas o ponto comum dos opositores oficiais é colocar-se em movimento, com o apoio de forças estrangeiras, para controlar o movimento de rebelião e privá-lo de toda possibilidade de formular reivindicações que se voltem tanto contra o regime como contra os que, do exterior, pedem sua queda.

O diário saudita Al-Hayat publicado em Londres é a expressão direta da diplomacia saudita que de um lado pede a intervenção militar direta e de outro lado pretende se impor ao Qatar e àTurquia, que pretende ser o principal líder na região. Para defender seus próprios interesses, o Al-Hayat dá uma versão interessante das relações entre os dois principais grupos de opositores. Em 3 de janeiro de 2012, o jornal afirma que “os diferentes grupos da oposição síria mentem uns aos outros (…) É a assinatura do acordo entre o Conselho Nacional Sírio (CNS) e o Comitê Nacional para a Mudança Democrática (CNCD, sigla do nome em francês, NdT) que ilumina essa questão”. O diário Al-Hayat continua: “em seu artigo 1º, o acordo estipula abertamente a “recusa de toda intervenção militar estrangeira, que afete a soberania e a independência do país” afirmando ao mesmo tempo que não considera uma “intervenção árabe como uma intervenção estrangeira”. Entretanto, o acordo contorna essa posição em seu segundo artigo, que chama a “proteger os civis por todos os meios legítimos no marco do direito internacional dos direitos humanos”.

Para o Al-Hayat“não existe dúvida de que a questão central desse documento é a intervenção estrangeira. Apesar do fato de que o documento a rechace, seus interpretes a aprovam (…) o comunicado publicado pelo escritório de Burhan Ghalioun (porta-voz do CNS), rechaça “a intervenção estrangeira por terra que pode prejudicar a integridade territorial síria e a independência”, entretanto, está de acordo com uma “intervenção estrangeira que imponha o estabelecimento de zonas neutras sob embargo aéreo e marítimo” (…) o que é certo, é que a oposição síria no estrangeiro é vítima de uma crise moral. Ela se dá conta de que uma intervenção internacional é um convite a fragmentar o país e a destruí-lo. Entretanto, seus esforços para chegar ao poder impõem a necessidade de imitar seus homólogos no Iraque e na Líbia (…)“.

Quanto a Haytham Manaa, porta-voz do CNCD caracterizado de “esquerda”, ele se diz em entrevista ao diário libanês Al-Akhbar (6 de janeiro de 2012), favorável a uma intervenção militar árabe, sob a forma de “capacetes verdes”, compostos de marroquinos, tunisianos e egípcios, alegando que, segundo ele, tal intervenção não faria vítimas civis, ao contrário de uma intervenção ocidental do tipo OTAN. Isso, entretanto, se assemelha ao prelúdio da intervenção militar da OTAN na Líbia, aberta com o envio de 5.000 membros das forças especiais do Qatar. Na mesma entrevista, H. Manaa destaca a necessidade de uma direção oposicionista formada por opositores “históricos”, pela falta de experiência do povo sírio!

Esse conjunto de elementos revela toda a importância e atualidade da conferência internacional realizada em Argel nos dias 10, 11 e 12 de dezembro de 2011, “Contra as guerras de ocupação, contra a ingerência nos assuntos internos dos países, em defesa da integridade e da soberania das nações”. Para a 4ª Internacional, a defesa prática do direito dos povos disporem de si mesmos passa pelo combate contra toda forma de ingerência. Isso é uma questão prévia para a definição de todo agrupamento independente cujas reivindicações se oponham tanto aos regimes policiais e corrompidos, correias de transmissão do imperialismo, quanto aos que pretendem substituí-los com base na defesa da propriedade privada dos meios de produção.

Notas

[1] O Sahel engloba, inteiramente ou em parte, os países: Senegal, sul da Mauritânia, Mali, extremo sul da Argélia, norte do Burkina Faso, Niger, extremo sul da Nigéria, centro do Chade, centro do Sudão (país que recentemente foi desmembrado a partir da ingerência dos EUA) e Cabo Verde. Por vezes, são também acrescentados outros 5 países: Etiópia, Eritreia, Djibuti, Somália e Quénia.

[2] O Magreb (que significa “poente”) é a região do noroeste da África, formada pelo Marrocos, Argélia, Tunísia, Líbia e Mauritânia.

[3] O Machrek (“nascente”) compreende os países árabes que ficam à leste da Líbia, indo do Egito até a Síria, Iraque e países da Península Arábica.

[4] Numa declaração do Comitê Internacional do Secretariado Unificado, que se pretende fraudulentamente ser a 4ª Internacional, podemos ler, a propósito da Síria: “Há forças militares sírias de esquerda engajadas nessa insurreição para que a auto-organização do povo se desenvolva”! Forças militares de esquerda armadas e financiadas pelo imperialismo ou pelo Qatar…! Quanto à auto-organização do povo submetido às violências e à guerra civil… Por trás da linguagem radical está a cobertura de extrema esquerda do imperialismo.

http://www.quarta-internacional.org/spip.php?article308

La crisis en Europa: un giro decisivo en la situación

La crisis en Europa: un giro decisivo en la situación      
Escrito por Alan Woods   
Lunes 14 de Mayo de 2012 15:48

hollande_tsiprasLas elecciones en Francia y Grecia representan un cambio fundamental en la situación. La crisis del capitalismo europeo ha entrado en una etapa nueva y turbulenta. Un estado de ánimo de ira está extendiéndose por toda Europa. Por supuesto, entendemos que los resultados electorales no reflejan la psicología de las masas con una precisión total. Son como una instantánea del estado de ánimo en un momento dado. Sin embargo, es necesario analizar los resultados electorales cuidadosamente, ya que muestran ciertas tendencias en la sociedad.

El primer efecto de la crisis económica que comenzó en el año 2008 fue de conmoción, lo que resultó en una parálisis temporal. Pero este estado de ánimo pronto desapareció, y fue reemplazado por una ola de huelgas y manifestaciones de masas. Sin embargo, tal es la gravedad de la crisis que la presión de las calles no es suficiente para provocar ningún cambio sustancial. El movimiento está, por lo tanto, volviendo hacia el frente político.

Los votantes en Grecia y Francia se han inclinado a favor de los candidatos anti-austeridad. En Gran Bretaña, las elecciones locales registraron un giro masivo contra la coalición de Conservadores-Liberaldemócratas y a favor del Partido Laborista. Los resultados parciales de las elecciones locales en Italia también sugieren un marcado alejamiento de los partidos mayoritarios. En ausencia de una alternativa seria de izquierda , algunos votantes giraron hacia un movimiento de protesta contra el euro, liderado por el ex cómico Beppe Grillo, que consiguió resultados significativos en muchos lugares, incluyendo ciudades como Parma y Génova.

Los mercados bursátiles cayeron en Francia y Grecia, pero en gran medida se recuperaron más tarde. Las bolsas griegas cayeron a mínimos de 20 años, mientras que en París el índice bursátil CAC 40 cayó un 2,8 por ciento, y el Xetra Dax alemán cerró con una caída de un 1,9 por ciento. El euro bajó un 0,3 por ciento frente al dólar hasta 1,3022 dólares.

De hecho, los mercados han recibido los resultados de las elecciones francesas con una ecuanimidad sorprendente. Esto sugiere que tienen un excelente conocimiento de la verdadera naturaleza del reformismo, o que han recibido informaciones fidedignas de que lo que dice el señor Hollande en su plataforma electoral es una cosa, y lo que señor presidente Hollande va a hacer es otra cosa totalmente distinta. Sin embargo, la Bolsa de Atenas había caído un 6,67% al final del lunes, lo que refleja la naturaleza extrema de la crisis en Grecia.

 

Francia: ¡Giro a la izquierda!

En Francia, los socialistas ganaron las elecciones presidenciales por primera vez en una generación. Nicolas Sarkozy entra ahora en los libros de historia como el presidente francés que, por primera vez desde 1981, no consiguió revalidar un segundo mandato. Se convierte en el último líder europeo en ser echado de su oficina en medio del enojo generalizado entre los votantes contra las medidas de austeridad provocadas por la crisis de la deuda de la eurozona. El candidato socialista, François Hollande, defendió la necesidad de un “pacto de crecimiento”. En su campaña, atacó a los banqueros y a los ricos y fue claramente percibido por muchos como un opositor a las medidas de austeridad.

En la primera ronda estuvo bajo la presión de la izquierda, en la medida que las encuestas de opinión indicaban que Mélenchon, el candidato del Frente de Izquierda (Partido Comunista y el Partido de Izquierda), iba a recoger un número significativo de votos. Hollande trató de cortar esto apareciendo estar más a la izquierda de lo que realmente es.

En declaraciones a un público eufórico en Corrèze, su base de operaciones en la Francia rural, el presidente francés recién elegido subió al escenario y anunció que iba a buscar una alternativa a la austeridad. Los coches hacían sonar sus bocinas cuando se dirigían por las calles del centro de París que no fueron cerradas al tráfico. “El cambio está llegando”, declaró el señor Hollande, que anunciaba el “fin de la austeridad” y una nueva era a favor de “la juventud y la justicia”.

Se comprometió a aumentar los impuestos a las grandes empresas y a las personas que ganan más de un millón de euros al año. Quiere aumentar el salario mínimo, contratar a 60.000 profesores más y bajar la edad de jubilación de 62 a 60 años para algunos trabajadores. Y consiguió algo menos del 52% de los votos en la segunda ronda. Esto demuestra que las masas están buscando una alternativa a las políticas de recortes y austeridad. Esto fue subrayado por las escenas de alegría en la noche del domingo en Francia, que se asemejaban a una fiesta callejera de masas.

Los partidarios jubilosos de Hollande se reunieron en la Plaza de la Bastilla en París, un punto de encuentro tradicional de la izquierda – para celebrar. Pero, al igual que ocurre en todas las buenas fiestas, esto será seguido seguramente por un gigantesco dolor de cabeza. El problema es que todos los reformistas creen que es posible resolver la crisis sin una ruptura radical con el capitalismo. Esta es una ilusión peligrosa y utópica. Si acepta el sistema capitalista también deben aceptarse las leyes del capitalismo.

Es muy bueno que el señor Hollande hable en contra de la austeridad. Pero hay un problema: en el contexto de la crisis mundial del capitalismo, si él no está dispuesto a romper con el capitalismo, la austeridad es la única política posible. Si François Hollande no entiende esto, los mercados se lo harán entender pronto. Como los griegos, Hollande quiere desafiar la insistencia alemana en la austeridad. Se han elevado grandes esperanzas por la victoria de Hollande, en Francia y en toda la zona del euro, y en que los duros planes de austeridad que han marcado la respuesta a la crisis de Europa hasta el momento serán aliviados en favor de un estímulo de crecimiento. Los franceses sienten ahora que las cosas se están moviendo con firmeza en su dirección, y que cuentan con el apoyo de diversos sectores en Europa y en Norteamérica.

Pero Hollande pronto se enfrentará a un dilema espinoso. ¿Va a estar con el pueblo griego, que lucha contra la austeridad o con el gobierno alemán y el Fondo Monetario Internacional, que dicen que el plan de rescate griego no puede ser renegociado?

 

Francia y Alemania

La señora Merkel no perdió tiempo en felicitar al presidente electo por teléfono y lo invitó a Berlín para mantener conversaciones en breve, pero advirtió que el pacto fiscal “no está en juego”. Ella dijo en una conferencia de prensa en Berlín: “El núcleo de la discusión es, realmente, sobre todo … si vamos a tener nuevamente programas de crecimiento que estén respaldados por la deuda o, efectivamente, si vamos a tener programas de crecimiento que sean sostenibles y, de hecho, se basen en la competitividad de los países. “

Francia ya no puede equipararse con Alemania como principal potencia europea. Por el contrario, es vista como parte de la Europa del sur, un miembro del club de los países enfermos, aunque en la actualidad sólo espera con inquietud en el departamento de pacientes externos. Los gobiernos español e italiano está mirando esperanzadoramente hacia el presidente francés. París se muestra comprensivo con Italia y Grecia. Hollande ha encontrado incluso algunas palabras amables para el viejo enemigo, el Reino Unido.

Esto podría conducir a un cambio de la correlación de fuerzas dentro de la UE. Podría resultar en un movimiento para crear un contrapeso a Alemania, una ruptura con la política exterior post-guerra de la burguesía francesa, que tenía la ilusión de que podría gobernar Europa en tándem con los alemanes. En la práctica, esto siempre fue un sueño imposible. El músculo industrial y financiero de Alemania le ha dado un papel preponderante, relegando a Francia al papel de un “socio”.de segundo orden.

Mientras la economía europea iba hacia adelante, esta situación podía estar, al menos, parcialmente disfrazada. Pero después de la debacle económica de 2008, la relación real ha sido expuesta cruelmente. La debilidad de Francia ha sido revelada a todos. Es Alemania quien lleva la batuta. Las tensiones entre París y Berlín podrían terminar en el naufragio del euro, e incluso en la desintegración de la propia Unión Europea (UE). En palabras deThe Financial Times (7 de mayo) “una escisión abierta entre Francia y Alemania podría causar problemas a escala europea, la apertura de una falla sísmica en los fundamentos de la Unión Europea y en su moneda única”.

La crisis griega ha puesto a prueba a Hollande mucho más rápido de lo que esperaba o deseaba. La señora Merkel exigirá que tome una posición en un lenguaje muy simple: ¿está usted con Atenas o con Berlín? Esta es una pregunta muy difícil de contestar, pero que debe responderse. Sin embargo, al dirigir sus observaciones a Berlín, Hollande se apresura a aclarar que es un hombre razonable que no quiere causar problemas. Él no desea cambiar el acuerdo “sólo añadirle cosas”, etc. etc.

La crisis política griega ha puesto todo en un crisol. El problema es tan grave que ningún tipo de maniobras y de acuerdos puede arreglarla. Hollande puede pensar que algunas cláusulas inteligentemente redactadas añadidas a un tratado de la UE serán suficientes para que se le conceda crédito. Los planes de Hollande incluyen los “bonos proyecto” (o bonos para el crecimiento, como otros los describen) para financiar el gasto en infraestructura de Europa, y una mayor inversión por parte del Banco Europeo de Inversiones. También, en el largo plazo, quiere que el Banco Central Europeo preste directamente a los estados individuales. Pero la señora Merkel ha dejado claro que esta no es su visión.

La canciller alemana podría incluso estar de acuerdo con los “bonos proyecto” respaldados por la UE, que financien proyectos de infraestructura. Algunos aumentos de los préstamos del Banco Europeo de Inversiones también podrían ser acordados. Pero ella no está dispuesta a “renegociar” el tratado. Como hemos visto, ella insiste en que “los programas para el crecimiento” deben basarse en la “competitividad” de los países. Si en esto está refiriéndose a Francia, ella es demasiado educada para decirlo abiertamente. Pero los alemanes van a estar observando a Francia como halcones.

Hollande todavía tiene que explicar cómo tiene la intención de reducir su déficit presupuestario al 3% del PIB el próximo año, cuando ha prometido que respetará todas sus promesas de campaña, tales como aumentar las prestaciones sociales al inicio del año escolar, los miles de puestos de trabajo extras para la enseñanza, así como la reversión parcial de la edad de jubilación de 62 a 60 años. Todo esto implica un gasto extra. Sin embargo, en Francia el gasto público ya representa el 56% del PIB, y la presión fiscal general también es alta. Y el FMI prevé un déficit cercano al 3,9% para 2013.

Aquí tenemos el dilema central. ¿Mantendrá Hollande firmemente sus compromisos con el pueblo francés? ¿O se inclinará ante la presión implacable de Merkel y “de los “mercados”? Parece más que probable que él decidirá que la discreción es la mejor parte del valor y de la retirada, mientras que se acepten desde Berlín algunos gestos para salvar la cara. Él dirá que ha cambiado la dirección de la política de la UE en favor del “crecimiento”. Merkel, acordaría algún tipo de “pacto de crecimiento” muy genérico, pero el precio serían más recortes. En esencia, todo permanecerá como antes. “plus ça change, plus c’est la même chose (“cuanto más cambia, más es la misma cosa “).

El Presidente de Francia se encontrará entre la espada y la pared. Si se va con los alemanes inmediatamente se expondría la falsedad de su retórica anti-austeridad . Provocaría profundas divisiones en el Partido Socialista y fortalecería la posición de Mélenchon y del Frente de Izquierda. la alianza entre el Partido Comunista y el Partido de Izquierda, que consiguió un 11,1% de los votos en la primera ronda de las elecciones presidenciales.

 

Terremoto en Grecia

La victoria de Hollande en las elecciones francesas es importante, pero fueron las elecciones en Grecia las que sacudieron a los mercados más que cualquier otra cosa. Los resultados de las elecciones generales del domingo 6 de mayo, sin embargo, no fueron realmente una sorpresa.

Grecia se ha visto obligada a hacer recortes profundos en las jubilaciones y en los salarios, aumentar los impuestos y recortar miles de empleos del sector público. Bajo el plan de rescate actual de Grecia, tendrán que ser encontrados en junio miles de millones de euros para nuevos recortes de austeridad – y el país cuenta también con préstamos de 30 mil millones de euros de la UE a devolver a plazos. Esta situación es claramente insostenible por la sencilla razón de que no se puede exprimir sangre de una piedra.

A pesar de todo esto, la UE y el Fondo Monetario Internacional han advertido que bloquearán pagos de préstamos adicionales hasta que el Parlamento griego aprueba el paquete de austeridad de mediano plazo, que incluye recortes más profundos en el gasto de salud y en los empleos del sector público. Éstas fueron precisamente las medidas que desencadenaron protestas masivas en los dos gobiernos anteriores.

Este resultado muestra un rápido cambio en la conciencia de las masas. Sólo fue hace unos meses que el principal partido burgués, Nueva Democracia, estaba esperando con confianza que el poder cayera en su regazo como una manzana madura. En cambio, fue humillado, mientras que el PASOK vio colapsar su voto. De ahí que los partidos anti-austeridad consiguieran más del 65 por ciento en la votación del 6 de mayo, en la cual los griegos expresaron su indignación contra el alto nivel de desempleo, los recortes salariales y una previsión de otros 18 meses de recesión.

La alarma de la burguesía se hizo eco en el mercado de valores de Grecia. El índice ASE cayó un 3,8 por ciento, a 619,52, el más bajo desde noviembre de 1992. Ya ha perdido un 9,1 por ciento este año, lo que refleja el nerviosismo extremo de la burguesía griega. El carácter inconcluso de las elecciones generales del 6 de mayo es una clara indicación de una aguda polarización hacia la izquierda y a la derecha. El centro político está derrumbándose ante nuestros ojos. Los dos principales partidos pro-europeos vieron hundirse sus votos. Esta es la forma que tomarán los acontecimientos, y no sólo en Grecia.

En Grecia, tanto la derecha de Nueva Democracia como su ex socio de coalición, el PASOK, vieron desvanecerse su apoyo en favor de partidos radicales a la izquierda y a la derecha. El apoyo a Nueva Democracia cayó del 33,5% en la última elección a sólo un 18,9% de los votos, con 108 escaños en el parlamento de un total de 300. Y sólo tuvo este resultado gracias a una ley que otorga al partido ganador un extra de 50 escaños. El socialdemócrata PASOK fue empujado a un tercer lugar humillante, con el 13,2% de los votos y 41escaños. En las elecciones anteriores habían conseguido el 43% de los votos. Nueva Democracia y el PASOK consiguieron conjuntamente apenas un tercio de los votos.

Esto es un terremoto político, un cambio repentino y agudo en la situación. Antonis Samaras, líder de Nueva Democracia, quiso formar un gobierno de unidad nacional con él como primer ministro, pero casi de inmediato abandonó el intento. The Economist dice:

“Su partido, que presionó para la convocatoria de elecciones anticipadas cuando estaba muy por delante en las encuestas de opinión, ahora se tambalea. Por su parte, el PASOK, si bien esperaba que le fuera mal, no previó que iba a ser superado por SYRIZA. Varios diputados socialistas que desertaron del PASOK el año pasado por el programa de austeridad consiguieron sus escaños ayer con SYRIZA, mientras que destacados reformistas del PASOK, entre ellos Anna Diamantopoulou, la ministra de Desarrollo y ex comisaria europea, perdieron sus escaños. (George Papandreou, el ex primer ministro, consiguió a duras penas un escaño en un distrito electoral provincial.).”

El gran ganador fue SYRIZA, la coalición de izquierda encabezada por el partido Synaspismos, que quedó en segundo lugar y que estuvo a punto de vencer a Nueva Democracia y ganar las elecciones. Aunque era evidente que SYRIZA iba a aumentar considerablemente su votación, el resultado final fue una sorpresa para los encuestadores. SYRIZA consiguió el apoyo de votantes del PASOK y alcanzó el 16,8% de los votos (frente a sólo el 4,6% por ciento en la elección anterior, en 2009), y tendrá 52 escaños en el parlamento, gracias a los grandes resultados conseguidos en Atenas y El Pireo, los mayores distritos electorales de Grecia y fuertes bastiones de la clase obrera, donde SYRIZA quedó en primer lugar.

La ironía de las situación es que incluso el conservador Samaras sabe que el plan de austeridad es contraproducente. Quería bajar los impuestos a las empresas griegas. Pero esto es rechazado de plano por la canciller alemana, Angela Merkel, con quien se ha enfrentado, y que sigue siendo implacable. Como reacción a los resultados de las elecciones, Merkel dijo que las medidas de austeridad “no son negociables”, y describió las reformas de Grecia como de la “máxima importancia”. Esta es la contradicción central, que ha impedido la formación de un nuevo gobierno tras las elecciones.

El abyecto fracaso del gobierno de Lucas Papademos, el primer ministro “tecnócrata” no elegido y apóstol de la “unidad nacional”, ha dejado un vacío que debe llenarse. Pero, ¿quién lo va a llenar? Papademos, ex vicepresidente del Banco Central Europeo, ha hecho un llamamiento a la estabilidad política “para que los sacrificios de los griegos no se desperdicien … después de que ya hemos recorrido una gran parte del difícil camino hacia la reconstrucción de la economía”. Pero después de tres años de tormento, de caída del nivel de vida y del creciente desempleo, que ha reducido a millones de griegos a la pobreza extrema, la gente está cansada de la misma vieja canción. No se puede ver ninguna señal de “reconstrucción de la economía”.

Por el contrario, ven en todas partes los signos demasiado visibles de un colapso económico: fábricas y astilleros cerrados, las persianas bajadas en los escaparates, y un desempleo cada vez mayor. Como resultado de las políticas impuestas por Bruselas y Berlín, Grecia ha sido relegada a una recesión aún más profunda de lo esperado en 2012, según el banco central del país. En una revisión de la estimación anterior, la economía griega va a contraerse un 5% más en los próximos meses.

El sufrimiento del pueblo griego está siendo empujado a los límites de la resistencia humana, y más allá. Cuando el diez por ciento de los griegos ha sido reducido a recibir paquetes de alimentos o de asistencia de salud, hablar de una mayor austeridad en el nombre de la “unidad nacional” cae en oídos sordos. El caos financiero ha causado un sufrimiento terrible y ha desatado un malestar social enorme. En la actualidad existe una profunda desconfianza hacia los partidos que las masas ven con razón como los arquitectos de la austeridad.

Como líder del mayor partido en el parlamento, Samaras intentó formar una coalición y no pudo. Samaras hizo hincapié en la noche del lunes 7 de mayo que su partido había hecho “todo lo posible” para formar un gobierno. “Traté de encontrar una solución para un gobierno de salvación nacional, con dos objetivos: para que el país permanezca en el euro y para cambiar la política del rescate a través de la renegociación”, dijo en un discurso televisado. “Hemos dirigido nuestra propuesta a todos los partidos que podrían haber participado en este esfuerzo, pero o bien rechazaron directamente su participación, o plantearon como condición la participación de otros que no aceptaron.”

A continuación todos los ojos se dirigieron a Alexis Tsipras, el líder de SYRIZA, que entró en negociaciones con otros partidos para formar un gobierno. “Vamos a agotar todas las posibilidades de llegar a un entendimiento, sobre todo con las fuerzas de la izquierda”, dijo Tsipras. Sin embargo, planteó condiciones de tal naturaleza que hizo imposible que cualquiera de los partidos burgueses las aceptara. Éstas incluían:

  • Cancelación de los términos del rescate financiero, en particular las leyes que incrementan los recortes de salarios y de las jubilaciones.

  • Demolición de las leyes que suprimen los derechos de los trabajadores, en particular, una ley que abolía los convenios colectivos de trabajo y que debería entrar en vigor el 15 de mayo

  • Exigir la representación proporcional en el Parlamento y el fin del bono de escaños de 50 al primer partido.

  • La investigación del sistema bancario de Grecia, que recibió casi 200 mil millones de euros de dinero público, y plantear la necesidad de algún tipo de control estatal sobre los bancos

  • La creación de un comité internacional para averiguar las causas del déficit público de Grecia, y poner en suspenso el pago de todos los servicios de la deuda.

El líder de SYRIZA hábilmente usó su posición para dar a conocer su rechazo a las “bárbaras” medidas de austeridad impuestas a Grecia por la UE. Al mismo tiempo que quiere que Grecia permanezca dentro de la eurozona. ¡Esto es ligeramente más complicado que la cuadratura del círculo! Las condiciones impuestas por Tsipras, naturalmente, hicieron prácticamente imposible la formación de una nueva coalición. Él hizo un llamamiento tanto a Nueva Democracia como al PASOK para que retiraran las garantías que le dieron por escrito a la “Troika” (El banco central europeo, el FMI, y la Comisión Europea, el gobierno de la UE).

Por lo tanto, la única posibilidad de formar un gobierno de izquierda dependía del acuerdo con el KKE (Partido Comunista Griego). Pero sus dirigentes lo rechazaron sin más explicaciones. Esto ha causado malestar en las filas del KKE, cuyos miembros son cada vez más críticos con las políticas sectarias y divisionistas de sus dirigentes. Es esta actitud sectaria de la dirección – una constante durante la campaña electoral – lo que explica por qué en una situación tan favorable fue el único partido anti-austeridad que incrementó sus votos en menos de un uno por ciento. En algunas zonas obreras el partido en realidad perdió votos. [Ver las elecciones griegas (II): el liderazgo del Partido Comunista limitado el impacto de la fiesta para leer más sobre esto, en inglés].

Como una nota al pie que podríamos añadir, la pequeña coalición de grupos de extrema izquierda (Antarsya) obtuvo sólo un 1,2 por ciento. Ellos afirman que esto fue un “gran paso adelante”, ya que cuadruplicaron sus votos, consiguiendo 75.000 en total. Sin embargo, sigue siendo una fuerza insignificante comparado con el apoyo de masas a SYRIZA y al KKE. También ignoran convenientemente el hecho de que en las elecciones regionales y municipales de 2010 habían conseguido 97.000 votos.

Al haber fracasado Tsipras inevitablemente en su empeño, el líder del PASOK y ex-ministro de Evangelos Venizelos, tomó sobre sí la tarea de tratar de formar un gobierno con muchas menos posibilidades de éxito. “Es necesario que el gobierno de unidad nacional incluya a todas las fuerzas que tienen un punto de vista pro-europeo”, dijo Venizelos. “El nivel mínimo de acuerdo es que Grecia se mantenga en el euro.”

La fórmula de la “unidad nacional” siempre fue la más vacía de todas las consignas políticas. El pueblo griego no es tan tonto como para ser incapaz de ver que la idea de unidad entre ricos y pobres es en realidad la “unidad” del burro y del hombre que lo monta, hundiéndole las espuelas en los costados. En el momento de escribir estas líneas, Venizelos seguía haciendo un esfuerzo para componer algún tipo de coalición precaria. Sin embargo, cualquier gobierno que fuera visto como una continuación de la serie anterior sería visto completamente como ilegítimo y podría provocar que las masas salieran a las calles otra vez.

 

La subida de SYRIZA

The Economist (7 de mayo) describió los resultados de las elecciones en Grecia como un espasmo de furia. Pero en realidad representan mucho más que eso. Un espasmo pasa rápidamente, pero los procesos que se están desarrollando en Grecia y en otros países no es probable que desaparezcan en el corto plazo. “Algunas personas interpretaron el resultado de las elecciones como un voto de ira”, dijo Tsipras. “Están cometiendo un error. Fue una decisión madura y consciente”.

SYRIZA es el frente electoral construido alrededor del partido Synaspismos, que tuvo su origen en una escisión del KKE en el pasado. Tsipras era el líder de la organización juvenil del Partido Comunista Griego, cuando se organizaron sentadas para protestar contra la reforma del sistema educativo bajo un gobierno de derecha, y tomó parte en las protestas anti-globalización. SYRIZA es vista claramente, por lo tanto, como parte de la “familia” comunista.

Teniendo en cuenta el escenario descrito anteriormente, es evidente que tendrán que ser convocadas nuevas elecciones, posiblemente tan pronto como el próximo mes. “Ahora estamos preparándonos para una segunda votación el próximo mes en un ambiente profundamente polarizado”, dijo un funcionario del gobierno decepcionado. Pero, ¿qué cambiará unas nuevas elecciones? Las tendencias ya observadas en estas elecciones no serán muy diferentes, salvo que el centro político seguirá desintegrándose y la polarización izquierda-derecha seguirá creciendo a su costa.

El ganador principal será SYRIZA, cuya popularidad se ha visto muy reforzada por su posición intransigente ante la formación de un gobierno de coalición. Al adoptar una postura de línea dura contra la UE y el Fondo Monetario Internacional, es probable que SYRIZA gane las próximas elecciones. “SYRIZA está luchando por el pueblo que ha sufrido a causa de las medidas de rescate, por eso voté por ellos”, dijo Demos Stergides, que perdió su trabajo en la industria textil el mes pasado y expresa el pensamiento de muchos trabajadores de Grecia.

Así SYRIZA se ha transformado en un factor vital en la política griega. “Para formar un gobierno se necesita el apoyo o la aceptación tácita de SYRIZA, y está claro que esto no va a darse”, dijo Lukas Tsoukalis, jefe del grupo de reflexión Eliamep, de Atenas.

En la actualidad, los tres partidos de izquierda tienen sólo 97 escaños en el parlamento de 300 miembros, dejando a SYRIZA muy por debajo de la mayoría incluso si se le uniera a ellos el PASOK, con 41 escaños – un movimiento que el líder derechista del PASOK, Evangelos Venizelos, es poco probable que haga. Pero está claro que SYRIZA aumentará su porcentaje de votos en las próximas elecciones, ya que las últimas encuestas de opinión ya lo parecen indicar.

Según una encuesta llevada a cabo por Alfa TV, SYRIZA saltaba del 16,7% a 27,7%, mientras que Nueva Democracia (ND) recuperaría algunos votos de otros partidos de la derecha, pasando del 18% al 20%, el PASOK pierde aún más (del 13% al 12%), el KKE pierde (del 8,5% al 7%), los Griegos Independientes (escisión de ND) sigue con el mismo porcentaje de votos (10%), mientras que el ultraderechista Amanecer Dorado pierde (desde el 6,9% hasta el 5,7%) y también pierde Izquierda Democrática (del 6,1% al 4,9%, y esto incluso antes de que se anunciara que estaba dispuesta a gobernar con un hipotético gobierno ND-PASOK).

Los titulados universitarios que puede que tengan que emigrar para encontrar trabajo están girando a SYRIZA. La juventud y los desempledos votaron masivamente a SYRIZA en las elecciones, junto con los profesionales independientes opuestos a la liberalización de sus tiendas cerradas, y los viejos izquierdistas que se enfrentan a mayores recortes de sus jubilaciones en virtud de un paquete de 11.500 millones de euros que debe ser aprobado por el parlamento entrante.

El objetivo de Tsipras de formar el primer gobierno de coalición de izquierda en la historia del país choca con el sectarismo del Partido Comunista Griego (KKE), que ha rechazado en repetidas ocasiones sus ofertas de cooperación. El partido restante de izquierda en el parlamento es Izquierda Democrática, una escisión de derecha de SYRIZA, que ha permanecido vacilante sobre si aceptar entrar en una coalición con ND y el PASOK. Al final Fotis Kouveli, líder de Izquierda Democrática, aclaró que su partido no participará en un gobierno de coalición con ND y el PASOK sin SYRIZA. Él ha entendido que hacerlo, simplemente significaría una sangría de votos de su partido a favor de SYRIZA.

De hecho, tanto Venizelos del PASOK como Kouvelis de Izquierda Democrática se dan cuenta de que la formación de un gobierno de coalición con el apoyo de Nueva Democracia, pero sin SYRIZA, plantearía dudas sobre su legitimidad a los ojos de las masas y por lo tanto de su viabilidad.

El hecho es que a pesar de que un gobierno PASOK-ND-Izquierda Democrática tendría un total de 168 escaños, con mayoría absoluta en el Parlamento, simplemente prepararía el terreno para un mayor fortalecimiento de SYRIZA. Sin embargo, ND, el PASOK e Izquierda Democrática también se enfrentan al dilema de que si no se alcanza un acuerdo ahora deberán convocarse nuevas elecciones en junio, donde SYRIZA aumentará su porcentaje de votos – con la posibilidad de ganarlas y, por lo tanto, también de beneficiarse de la bonificación de 50 escaños-, mientras que los otros verán declinar su apoyo. Si no consiguen formar algún tipo de coalición ahora y las elecciones se celebran en junio, ¡la perspectiva de un gobierno de izquierda se convierte aún más concreta!

 

O … o

Como hemos visto anteriormente, es difícil ver cómo cualquiera de los partidos o una combinación de partidos, podría formar una coalición estable para continuar con las medidas de austeridad acordadas con los acreedores de Grecia, la Unión Europea y el Fondo Monetario Internacional. Ellos son los verdaderos amos de la Grecia actual.

Si, como es posible, SYRIZA gana las elecciones en junio y se las arregla para formar un gobierno de izquierda, sus políticas y sus dirigentes serán puestos a prueba. Sus líderes caerán inmediatamente bajo la presión de la burguesía, no sólo de Atenas sino también de Bruselas y de Berlín. Por otro lado, estarán bajo la presión de millones de trabajadores griegos que les votaron por un cambio.

Al votar a SYRIZA, los trabajadores, la juventud radicalizada, los jubilados desesperados, los desempleados y los pequeños burgueses arruinados no estarán votando solo contra los viejos partidos que trajeron la austeridad y la miseria. Estarán votando contra un status quo que se ha vuelto intolerable, contra un sistema corrupto y en bancarrota. Ellos votarán por un cambio fundamental: por una revolución. Pero a menos que la izquierda tome medidas inmediatas para expropiar a los banqueros y a los capitalistas, se convertirán en un juguete de los mercados.

El hecho es que la dirección de SYRIZA insiste en buscar una solución dentro de los límites del capitalismo, incluso dentro de la Unión Europea. Una solución que no esté basada en la abolición del capitalismo es la que ya ha sido adoptada por los gobiernos anteriores. El resultado por lo tanto, sería un gobierno de crisis. Fracasaría en satisfacer las demandas de las masas que votaron por él. En tales condiciones, se produciría eventualmente una desilusión en su propia base, los trabajadores y la juventud de Grecia. Eso prepararía el terreno para un regreso de la derecha en algún momento. Así, después de un período un gobierno de izquierda sería reemplazado por una coalición de partidos de derecha.

Grecia se ha visto sumida en el caos social y político por la crisis del capitalismo. Estos problemas no pueden ser resueltos por medios “normales”. Las cosas han ido demasiado lejos como para resolverse con soluciones intermedias. No se puede curar el cáncer con una aspirina. A largo plazo, la crisis sólo puede resolverse ya sea porque la clase obrera tome el poder en sus manos, o por una pesadilla de la reacción.

El nudo está apretándose alrededor del cuello de Grecia. Todo apunta a una nueva e incluso más grave crisis en Grecia en los próximos meses. La UE se enfrentará a una dura elección: ¿enviará más ayuda todavía a Grecia para reponer la retirada de fondos del FMI? ¿O va a cerrar el grifo y permitir que Grecia se hunda?

La última posibilidad está siendo discutida abiertamente. Jörg Asmussen, miembro de la junta ejecutiva del Banco Central Europeo, planteó por primera vez la posibilidad de una salida griega del euro – una opción que el BCE se había negado a reconocer en público. “Grecia tiene que ser consciente de que no hay alternativa al programa de reformas acordado si quiere seguir siendo miembro de la eurozona”, dijo Asmussen a un periódico alemán.

The Economist concluye: “El futuro de Grecia en el euro ahora parece más inestable: algunos analistas del mercado dicen hoy que las posibilidades de una “Grexit” (salida de Grecia, en un juego de palabras en ingles, NdT) han aumentado del 40% a más del 50%. El próximo gobierno debe impulsar un nuevo paquete de austeridad en el Parlamento en junio según los términos del segundo acuerdo de rescate de Grecia con la UE y el FMI. Este incluye recortes adicionales de gastos por 11.500 millones de euros, junto con impopulares medidas estructurales: las jubilaciones se reducirán de nuevo y miles de trabajadores del sector público se convertirán en prescindibles.

“Los funcionarios del FMI han advertido que si la hoja del calendario de reformas se mueve, Grecia no recibirá su próxima ronda de financiación. Eso podría significar que los salarios y las jubilaciones no puedan pagarse el próximo mes, una perspectiva posible que probablemente centrará la mente de los votantes después de la explosión de furia de ayer. “Tal vez deberían pensar en el resultado de ayer como la primera ronda de las elecciones, como una expresión de desahogo”, dijo un ex ministro del gabinete. -Luego, los electores deberán votar de acuerdo a sus intereses reales en la segunda ronda. ‘”

La elección se plantea ahora en términos muy duros: ¿se comprometerá Grecia a hacer miles de millones de euros adicionales en recortes presupuestarios en los próximos meses, según lo exigido por Merkel y compañía? Tsipras se ha expresado muy claramente: “El veredicto popular ha declarado claramente nulo el acuerdo de rescate”. Pero si ese es el caso, el FMI ha sido igualmente claro en cuanto a sus intenciones: no va a autorizar la liberación del siguiente tramo de dinero a Grecia. Eso significaría que el gobierno griego, simplemente se quedaría sin dinero. Los recortes más brutales de las jubilaciones y de los salarios aplicados hasta ahora no serían nada en comparación con el consecuente recorte en los niveles de vida.

La salida forzada de Grecia del euro se plantearía a quemarropa. El caos resultante y los trastornos sociales serían sumamente peligrosos para el capitalismo en Grecia. Sería la diferencia entre un coche cuesta abajo con los frenos malos y otro sin frenos en absoluto. La burguesía de la UE está consternada por esta perspectiva. Pero si no se hace nada y no se hace pronto, esta es la perspectiva a la que se va a enfrentar más temprano que tarde.

El resultado inevitable sería un cesación de pagos caótica de la deuda griega y la expulsión de Grecia de la eurozona, y probablemente también de la propia UE. Las consecuencias para el conjunto de Europa serían catastróficas, pero para Grecia sería aún peor. Contrariamente a las ilusiones nacionalistas del KKE, un retorno al dracma (la antigua moneda nacional) no resolvería nada, y convertiría una mala situación en algo mucho peor. El nuevo dracma no tendría ningún valor en los mercados internacionales. El colapso de la moneda significaría una inflación por las nubes, una corrida bancaria (retirada masiva de fondos de los bancos) y la liquidación de los ahorros y de las jubilaciones. Esta situación podría estar preñada de implicaciones revolucionarias, como en Alemania en 1923.

 

¿Revolución o contrarrevolución?

El movimiento hacia la transformación socialista de la sociedad no se llevará a cabo en una línea recta. Inevitablemente habrá altibajos. Los períodos de avances tormentosos serán seguidos por períodos de cansancio, calma, derrotas, e incluso por períodos de reacción. Habrá cambios intensos a la izquierda y a la derecha. Pero cada movimiento hacia la reacción sólo preparará cambios incluso más grandes a la izquierda. En la actualidad, no hay peligro de fascismo o incluso de reacción bonapartista en ningún país capitalista desarrollado. Pero eso puede cambiar en el período que se abre.

Tarde o temprano, la clase dominante griega sacará la conclusión: hay demasiadas huelgas, demasiadas manifestaciones, demasiado caos. ¡Abajo la anarquía! ¡Exigimos Orden! A la larga, la clase dominante se moverá abiertamente hacia el bonapartismo. Habrá todo tipo de conspiraciones de la derecha como la conspiración Gladio e Europa en los años 1970. Sin embargo, dada la fuerza de la clase obrera y de sus organizaciones, esto puede allanar el camino para una explosión de la lucha de clases e incluso de una guerra civil abierta.

Pero esta no es una perspectiva inmediata. En Grecia, la perspectiva es de un largo período de extrema inestabilidad política, en la que un gobierno de coalición inestable seguirá a otro. El péndulo oscilará violentamente de izquierda a derecha, y viceversa. Y cada oscilación del péndulo será más extrema que la anterior, como Trotsky explicó en el prólogo a la Historia de la Revolución Rusa:

“Los cambios rápidos que experimentan las ideas y el estado de ánimo de las masas en las épocas revolucionarias no son producto de la elasticidad y movilidad de la psiquis humana, sino al revés, de su profundo conservadurismo. El rezagamiento crónico en que se hallan las ideas y relaciones humanas con respecto a las nuevas condiciones objetivas, hasta el momento mismo en que éstas se desploman catastróficamente, por decirlo así, sobre los hombres, es lo que en los períodos revolucionarios engendra ese movimiento exaltado de las ideas y de las pasiones que a las mentalidades policiacas se les antoja fruto puro y simple de la actuación de los «demagogos».

Las masas no van a la revolución con un plan preconcebido de la sociedad nueva, sino con un sentimiento claro de la imposibilidad de seguir soportando la vieja sociedad. Sólo el sector dirigente de cada clase tiene un programa político, programa que, sin embargo, necesita todavía ser sometido a la prueba de los acontecimientos y a la aprobación de las masas. El proceso político fundamental de una revolución consiste precisamente en que esa clase perciba los objetivos que se desprenden de la crisis social en que las masas se orientan de un modo activo por el método de las aproximaciones sucesivas. Las distintas etapas del proceso revolucionario, consolidadas por el desplazamiento de unos partidos por otros cada vez más extremos, señalan la presión creciente de las masas hacia la izquierda, hasta que el impulso adquirido por el movimiento tropieza con obstáculos objetivos. Entonces comienza la reacción: decepción de ciertos sectores de la clase revolucionaria, difusión del indeferentismo y consiguiente consolidación de las posiciones adquiridas por las fuerzas contrarrevolucionarias. Tal es, al menos, el esquema de las revoluciones tradicionales” (León Trotsky, del Prólogo a la Historia de la Revolución Rusa)..

La crisis del capitalismo crea el tipo de condiciones enconadas en las que las ideas racistas y reaccionarias pueden encontrar un eco en sectores de la población. Cuando el movimiento obrero no ofrece una alternativa, las personas que no entienden la verdadera razón de por qué no hay suficientes puestos de trabajo ni de viviendas pueden ser persuadidas por los demagogos reaccionarios para buscar un chivo expiatorio.

Los elementos de esto ya pueden verse en el surgimiento de movimientos como Amanecer Dorado (Chryssi Avghi) en Grecia, que entrará en el Parlamento por primera vez, después de haber conseguido un 7% de los votos y 21 escaños. Este es un grupo racista neonazi que defiende la expulsión de los inmigrantes ilegales, lo que compagina con la organización de bandas de camisas negras que atacan y golpean a los activistas de izquierda. En Francia, el voto a favor de Mélenchon, por un lado, y de Marine Le Pen en el otro indica el mismo proceso de polarización (aunque el FN francés se ha alejado del fascismo).

Esto es una advertencia a la clase obrera de lo que puede suceder si no toma el poder. Sin embargo, es erróneo exagerar. En esta etapa, los fascistas son una pequeña fuerza. Consiguieron menos del siete por ciento de los votos, frente a casi el 17 por ciento de SYRIZA. Por otra parte, básicamente recogen los votos que la también ultraderechsita LAOS estaba perdiendo debido a su participación en el gobierno de coalición anterior. Y, como hemos visto en la encuesta de opinión antes citada, ya algunos de los votantes de Amanacer Dorado han cambiado de posición. Sería muy erróneo pensar que todos los votantes de este partido son neo-nazis. Muchos votaron por ellos en señal de protesta Además, el voto combinado de los partidos de izquierda fue de más del 31 por ciento. Esto significa que los fascistas consiguieron menos de un cuarto de los votos de la izquierda.

Sin embargo, tampoco debemos ignorar la amenaza que esos partidos pueden plantear en el futuro. Las bandas fascistas, como los lúmpenes de camisa negra de Amanecer Dorado pueden ser utilizados para intimidar y aterrorizar a la clase obrera, como Patria y Libertad en Chile en 1973. Esto ya lo están tratando de hacer.

Es decir, que pueden desempeñar el papel de auxiliares de la reacción bonapartista. Sin embargo, la burguesía no les permitirá tomar el poder, como lo hicieron con Hitler y Mussolini en el pasado. La historia reciente muestra que cuando la burguesía llega a la conclusión de que la democracia ya no le sirve, se orientan a un gobierno militar, prefiriendo basarse en la cúpula del ejército más que en los dirigentes enloquecidos de estos pequeños partidos fascistas. La burguesía, sin embargo, no recurrirá a la reacción hasta que haya agotado todas las demás posibilidades.

Lo que tenemos que enfatizar, sin embargo, es que mucho antes de que se llegue a esa etapa, los trabajadores habrán tenido muchas posibilidades de tomar el poder en un país tras otro. Sólo después de una serie de graves derrotas de la clase obrera se plantearía el peligro de una dictadura bonapartista.

La clase dominante, ya sea en Grecia o en cualquier otro país, no apoya la democracia por sentimentalismo, sino porque por lo general es la forma más económica de gobernar la sociedad, mientras que engaña a las masas con el pensamiento de que son ellas las que deciden sus asuntos. En última instancia, cuando ve que sus intereses fundamentales están en peligro, la burguesía no dudará en recurrir a la reacción desnuda, dejando a un lado la máscara de la democracia y del imperio de la ley, para revelar su verdadero rostro.

Aunque una parte de la clase dominante griega, sin duda, debe estar jugando con la idea de un golpe de estado, incluso ahora, las condiciones objetivas para ello no existen en la actualidad. Los resultados electorales muestran un giro claro a la izquierda. La clase obrera griega es más fuerte que en cualquier otro momento de la historia. No ha sufrido ninguna derrota decisiva en décadas. Por otra parte, la clase media está buscando a la izquierda (en particular, a SYRIZA) para una alternativa. Los recuerdos del golpe militar de 1967 y la brutal dictadura de los coroneles todavía están frescos en la mente de la clase obrera.

Por todas estas razones, cualquier intento de avanzar en esa dirección podría provocar una resistencia feroz. El resultado sería la guerra civil, que la burguesía no estaría segura de ganar. Por lo tanto, la perspectiva del bonapartismo en Grecia no está inmediatamente a la orden del día. La crisis puede prolongarse durante años antes de que se alcance un enfrentamiento decisivo. Mucho antes de que la cuestión de la reacción se plantee, la clase obrera habrá tenido muchas oportunidades de tomar el poder.

Cuando se consideran las acciones heroicas de los trabajadores y de la juventud de Grecia durante los últimos tres años, habría que ser de madera para no sentirse profundamente conmovido e inspirado. ¿Qué más tenemos derecho a pedirles? Han movido cielo y tierra para cambiar la sociedad. Si no lo han logrado hasta el momento, no es por su culpa. Es debido a que carecían de la dirección necesaria para garantizar la victoria.

Esto significa concretamente que la tarea inmediata es fortalecer a SYRIZA tanto política como organizativamente. Por el momento, SYRIZA es una coalición basada en su componente principal, Synaspimos. SYRIZA debe convertirse en un partido con el derecho a la existencia de tendencias diferentes que puedan expresar sus puntos de vista. En segundo lugar, se debe evitar la tentación de ser “realista” o “pragmático”, de caer en las trampas que los partidos burgueses están preparando muy ocupados. En las próximas elecciones, está claro que SYRIZA emergerá mucho más fuerte en el parlamento. Al mismo tiempo, se debe insistir en la unidad con el KKE y las otras fuerzas de izquierda. Ya muchos votantes del KKE han indicado que pueden orientarse a SYRIZA en unas nuevas elecciones. Esta es una palanca que puede utilizarse para empujar a los dirigentes del KKE a abandonar su sectarismo y unirse a SYRIZA en un auténtico Frente Único de las organizaciones obreras. En tercer lugar, la dirección del partido debe adoptar un verdadero programa revolucionario socialista, el único programa que puede traer el cambio que tanto desean las masas.

En última instancia, sus posibilidades de éxito dependerán de la capacidad de los marxistas para ganar a las capas más decisivas de la clase obrera y de la juventud para el programa de la revolución socialista. Eso significa el fortalecimiento del ala marxista del partido, como un primer paso para ganar a todo el partido, y luego al conjunto de la clase obrera para el programa de la revolución.

Londres, 11 de mayo

 http://argentina.elmilitante.org/internacional-othermenu-33/europa-othermenu-37/5852-la-crisis-en-europa-un-giro-decisivo-en-la-situacion.html

Brasil deve girar US$ 110 bilhões em compra de aviões

Brasil deve girar US$ 110 bilhões em compra de aviões


Alberto Komatsu

O Brasil deverá movimentar US$ 110 bilhões para a aquisição de 1.090 aviões até 2030. A estimativa é da fabricante americana Boeing, líder de mercado no país, com 45% de participação, ou o equivalente a 180 jatos em operação. Em sua maioria, são modelos 737-300, operados principalmente pela Gol e pela Webjet.

A projeção foi divulgada pela Boeing na semana passada, em Seattle (EUA), sede da fábrica de aviões comerciais da companhia. O estudo engloba o mercado total, não só a projeção de vendas da própria Boeing.

A estimativa mostra que o Brasil deverá responder por 42% da necessidade de aviões da América Latina, em quantidade, até 2030. De acordo com a Boeing, a região deverá comprar 2.570 aeronaves para uso comercial, nos próximos 18 anos. O México vem em segundo lugar, com 445 jatos. Demais países ficam com os 41% restantes.

Em volume de investimentos, o Brasil deverá responder por 44% do movimento de US$ 250 bilhões, previsto para a América Latina até 2030. O México, por sua vez, tem potencial para investir US$ 35 bilhões, ou o equivalente a 14% do total. Outros US$ 105 bilhões ficarão a cargo de outros países latino-americanos.

“As maiores companhias da América Latina têm potencial para competir com qualquer companhia aérea do mundo”, afirmou o diretor de marketing da divisão de aviação comercial da Boeing para a América Latina, Mike Barnett.

O executivo chamou a atenção para as projeções de crescimento da América Latina, entre as melhores do mundo entre os anos de 2011 e 2030. Pelo estudo da Boeing, o tráfego aéreo na América Latina deverá registrar crescimento médio anual de 6,7%, acima da média mundial, de 5,1% prevista para esse período.

É a terceira maior taxa, considerando-se o fluxo de passageiros dentro de uma mesma região. Perde apenas para os 7,5% da China e os 7% da Ásia-Pacífico.

“O Brasil é muito importante para nós tanto no segmento de defesa quanto no comercial. O país tem um tremendo crescimento econômico que o torna um parceiro que nós realmente queremos fazer negócios”, diz o vice-presidente de estratégia internacional e desenvolvimento de negócios da divisão de aviões comerciais, Travis Sullivan.

Grande parte do crescimento de países e regiões emergentes, conforme a Boeing, virá da perda de participação da América do Norte e da Europa, os dois maiores e mais tradicionais mercados da aviação comercial.

Segundo a Boeing, em 1990 a América do Norte e a Europa respondiam por 72% do tráfego aéreo global. Em 2010, essa fatia recuou para 55%. Até 2030, essas duas regiões deverão ter participação combinada de 41%.

A previsão da demanda global de aviões entre 2011 e 2030, segundo a Boeing, é de 33,5 mil unidades. O investimento está estimado em US$ 4 bilhões nesse período. O estudo da fabricante americana prevê que a frota mundial para uso comercial deverá ter 39,5 mil aviões, em 2030. Em 2010, o total era de 19,2 mil.

As previsões da companhia americana também mostram que a América Latina deverá apresentar o sexto maior crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) do mundo, até 2030, com taxa média anual de 4,2%. A maior média de expansão deverá ficar com o sul da Ásia (7,1%), seguida pela China (7%), Ásia-Pacífico (4,7%), África e Sudeste da Ásia, estes dois últimos com média por ano de 4,4%.

O caríssimo kW brasileiro


O governo tem adotado medidas para dar mais competitividade à indústria instalada no País, mas até agora não atacou fatores estruturais que fazem do Brasil um dos países mais caros do mundo para a produção de manufaturas. Um exemplo é o custo da energia elétrica fornecida à indústria, 52% maior do que a tarifa média internacional, segundo a Agência Internacional de Energia (IEA), citada em recente estudo divulgado pela Firjan. O levantamento da IEA mostrou que a tarifa média cobrada da indústria brasileira era de R$ 329 por megawatt-hora (MWh) em comparação com a média de R$ 215,50 por MWh em 27 países analisados. Isso não só prejudica a capacidade dos produtos brasileiros de concorrer no mercado internacional, mas afeta diretamente os preços internos para o consumidor, favorecendo a aquisição de similares importados, com efeitos danosos sobre os níveis de emprego no País.

Como os industriais têm salientado, isso é um contrassenso em um país que tanto investiu e continua a investir pesado em energia hidrelétrica, fonte renovável, limpa e muito mais barata do que a queima de combustíveis fósseis para produzir eletricidade, como se verifica em muitos países industrializados. A energia elétrica é muito cara no Brasil principalmente por causa da carga tributária que incide sobre as tarifas. O mesmo estudo mostra que os tributos federais, incluindo o PIS/Cofins, com alíquota variável entre 12% e 15%, e o ICMS cobrado pelos Estados, representam, em média, 31,5% da tarifa final. A alíquota média do ICMS sobre consumo de energia é de 25%, mas há Estados em que esse tributo alcança 40%.

Os responsáveis pela condução da política econômica não desconhecem esse problema. As reivindicações da indústria e ameaças de multinacionais de fechar as portas de subsidiárias no País, dado o alto custo de energia elétrica, estão “emparedando” o governo, como disse uma fonte de Brasília a este jornal. Buscando uma saída, começou um jogo de empurra entre a União e os Estados. O governo aceitaria baixar seus tributos, se os Estados concordassem em fazer o mesmo com relação ao ICMS. Com essa finalidade, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, planeja apresentar uma proposta da União ao Conselho de Política Fazendária (Confaz), composto pelos secretários da Fazenda dos Estados. Dessa reunião do colegiado deveria sair uma decisão “conjunta” para reduzir a carga tributária sobre as contas de eletricidade pagas pela indústria.

Tudo isso cheira a encenação. Se o governo federal estivesse decidido a fazer essa desoneração, poderia baixar a alíquota do PIS/Cofins de imediato sobre o consumo industrial de eletricidade, antes de convocar reunião do Confaz. Com isso, teria autoridade moral para induzir os Estados a reduzirem suas alíquotas de ICMS sobre as contas de luz, e argumentos para isso não faltariam.

Empenhados em atrair indústrias para seus territórios, os Estados, com exceções, têm concedido incentivos fiscais a torto e a direito a empreendimentos diversos, no contexto da guerra fiscal, ao arrepio da lei. Contudo, esses incentivos não atingem o ICMS sobre as contas de eletricidade, cuja cobrança é uma fonte fácil e garantida de arrecadação. Os governos estaduais não se dão conta de que podem perder fábricas se continuarem com alíquotas tão elevadas de ICMS sobre energia, pois induzem investidores a buscar condições mais favoráveis em outros países.

Condicionar a decisão federal a um acerto prévio com os Estados só complica a situação, como mostra a reação dos governadores que já reivindicam “compensações”. Há pleitos legítimos dos Estados que devem ser levados em consideração pelo Executivo e pelo Congresso, mas a redução da carga tributária sobre eletricidade para a indústria deve estar acima dessas questões. Trata-se de dar mais competitividade à indústria nacional como um todo – aí incluído o setor agroindustrial. O que está em jogo é a capacidade de o Brasil poder firmar-se como potência industrial em um mundo agressivamente competitivo.

http://www.defesanet.com.br/tecnologia/noticia/5631/O-carissimo-kW-brasileiro-

China: ascensão, queda e retomada como poder global – as lições da história

China: ascensão, queda e retomada como poder global – as lições da história

E-mailImprimirPDF

10 ABRIL 2012
CLASSIFICADO EM INTERNACIONAL – IMPERIALISMO

imagemCrédito: Old

James Petras

Introdução

O estudo do poder mundial tem sido prejudicado por historiadores eurocêntricos que têm distorcido e ignorado o papel dominante que a China desempenhou na economia mundial entre 1100 e 1800. A brilhante pesquisa histórica de John Hobson1 a respeito da economia mundial durante esse período fornece dados empíricos abundantes, que tratam da superioridade econômica e tecnológica da China sobre a civilização ocidental na maior parte do milênio, antecedendo sua conquista e o declínio no século XIX.

A reemergência da China como poder econômico mundial levanta importantes questões sobre o que podemos aprender de sua anterior ascensão e queda, bem como a respeito das ameaças internas e externas a esse superpoder econômico emergente para o futuro imediato.

Primeiramente, vamos esboçar os principais contornos da ascensão histórica da China rumo à superioridade econômica no Ocidente antes do século XIX, seguindo de perto as considerações de John Hobson emThe Eastern Origins of Western Civilization [As origens orientais da Civilização Ocidental]. Desde que a maioria dos historiadores econômicos do ocidente (liberais, conservadores e marxistas) apresentou a China histórica como uma sociedade estagnada, retrógrada e paroquial, como um “despotismo oriental”, algumas correções cuidadosas precisam ser feitas. É especialmente importante enfatizar como a China, a potência tecnológica mundial entre 1100 e 1800, tornou possível a emergência do Ocidente. Foi apenas por meio do empréstimo e assimilação das inovações chinesas que o Ocidente foi capaz de fazer a transição para as economias modernas capitalistas e imperialistas.

Na parte 2, vamos analisar e discutir os fatores e as circunstâncias que levaram ao declínio da China no século XIX e sua subsequente dominação, exploração e pilhagem pelos países imperiais do Ocidente, primeiramente a Inglaterra e depois o resto da Europa, Japão e Estados Unidos.

Na parte 3, vamos delinear brevemente os fatores que levaram à emancipação da China do jugo do poder colonial e neocolonial e analisaremos sua recente ascensão à condição de segunda maior potência econômica mundial.

Por fim, vamos observar as ameaças do passado e do presente ao processo de emancipação da China com relação ao poder colonial e neocolonial, destacando as similaridades entre o colonialismo britânico dos séculos XVIII e XIX e as atuais estratégias imperialistas dos EUA, focando nos pontos fracos e nos pontos fortes das respostas chinesas do passado e do presente.

China: a ascensão e a consolidação do poder global (1100-1800)

Num formato comparativo sistemático, John Hobson fornece uma fartura de indicadores empíricos demonstrando a superioridade da China na economia global com relação ao Ocidente e em particular à Inglaterra. Eis alguns fatos marcantes:

Já em 1078, a China era o maior produtor mundial de aço (125.000 toneladas); enquanto a Grã-Bretanha em 1788 produzia 76.000 toneladas.

A China era a líder mundial em inovação técnica na manufatura têxtil, sete séculos antes da “revolução têxtil” da Inglaterra, no século XVIII.

Suas inovações na produção de papel, impressão de livros, armas de fogo e ferramentas produziram uma superpotência manufatureira, cujas mercadorias eram transportadas pelo mundo afora pelo mais avançado sistema de navegação.

A China possuía os maiores navios comerciais do mundo. Em 1588, as maiores embarcações inglesas suportavam 400 toneladas; as chinesas, 3 mil toneladas. Mesmo já tardiamente, no final do século XVIII, os mercadores chineses empregaram 130.000 navios de transporte, muitas vezes o contingente total da Grã-Bretanha. A China manteve sua posição proeminente na economia mundial até o início do século XIX.

Industriais ingleses e europeus seguiram a liderança chinesa, assimilando e tomando de empréstimo sua mais avançada tecnologia, ansiosos para penetrar no avançado e lucrativo mercado chinês.

Com bancos, com uma economia de papel-moeda estável, com produção e altos resultados na agricultura, a renda per capita da China equiparou-se com a da Grã-Bretanha já em 1750.

A posição de domínio global da China foi desafiada pela ascensão do imperialismo britânico, que adotou as inovações tecnológicas, de navegação e de mercado da China e outros países asiáticos, a fim de saltar etapas anteriores e se tornar uma potência mundial.2

O imperialismo ocidental e o declínio da China

A conquista britânica e ocidental do Oriente foi baseada na natureza militar do Estado imperialista, nas suas relações econômicas não recíprocas com os parceiros comerciais estrangeiros e na ideologia ocidental imperialista, que motivou e justificou as conquistas em terras estrangeiras.

Diferentemente da China, a revolução industrial inglesa e sua expansão além-mar foi dirigida por uma política militarista. De acordo com Hobson, durante o período de 1688-1815, a Grã-Bretanha esteveenvolvida em guerras durante 52% do tempo.3 Enquanto os chineses se basearam nos mercados abertos, na produção superior, na sofisticada atividade bancária e comercial, a Inglaterra se utilizou da proteção alfandegária, da conquista militar, da destruição sistemática de empresas estrangeiras competitivas e da apropriação e saque de recursos locais. A predominância global da China foi baseada em “benefícios recíprocos” com seus parceiros comerciais, enquanto a Inglaterra recorria ao uso de exércitos mercenários de ocupação, repressão brutal e à política do “dividir para conquistar”, de estímulo às rivalidades locais. Diante da resistência nativa, a Inglaterra (assim como outras potências imperialistas ocidentais) não hesitou em exterminar comunidades inteiras.4

Impossibilitada de superar o mercado chinês através de uma melhor competitividade econômica, a Inglaterra recorreu ao brutal poderio militar. Ela mobilizou, armou e comandou mercenários, retirados de suas colônias na Índia e em quaisquer lugares para forçar sua transferência para a China e impor tratados desiguais com tarifas mais baixas. Como resultado, a China foi inundada pelo ópio inglês produzido em suas plantações na Índia – apesar das leis chinesas que proibiam ou regulavam a importação e a venda de narcóticos. Os governantes chineses, há muito acostumados à sua superioridade comercial e industrial, estavam despreparados para as “novas regras imperialistas” impostas pelo poder global. A disposição ocidental para usar o poder militar a fim de ganhar colônias, pilhar recursos e recrutar amplos exércitos mercenários comandados por oficiais europeus, decretou o fim da China como potência mundial.

A China tem baseado sua predominância econômica na “não interferência nos assuntos internos de seus parceiros comerciais”. Em contraste, os imperialistas britânicos intervieram violentamente na Ásia, reorganizando economias locais para seguir as necessidades do império (eliminando competidores econômicos, inclusive fabricantes de algodão indianos mais eficientes) e passou a ter controle na política local, no aparato econômico e administrativo a fim de estabelecer o Estado colonial.

O império britânico foi construído com recursos trazidos das colônias e através de militarização massiva de sua economia.5 Desse modo, foi fácil garantir a supremacia militar sobre a China. A política externa da China foi prejudicada pela excessiva confiança de suas elites nas relações comerciais. Autoridades chinesas e elites comerciais locais visaram acalmar a Inglaterra e convenceram o seu imperador a conceder enormes regiões extraterritoriais, abrindo mercados em detrimento das manufaturas chinesas, entregando a soberania local. Como sempre, a Inglaterra incentivou rivalidades internas e revoltas que vieram a desestabilizar o país.

A penetração ocidental e inglesa e a colonização do mercado da China criaram uma classe inteiramente nova: os ricos ‘compradores’ entreguistas chineses importavam bens ingleses e facilitavam a tomada dos mercados locais e seus recursos. A pilhagem imperialista forçou uma maior exploração e taxação de grande contingente de camponeses chineses e trabalhadores. Os governantes da China eram obrigados a pagar as dívidas de guerra e financiar o deficit comercial imposto pelo poder imperial ocidental através da exploração do seu campesinato. Essa situação levou os camponeses à fome e à revolta.

No início do século XX (menos de um século depois da Guerra do Ópio), a China descendeu da condição de potência econômica mundial para a de um país semicolonial falido, com uma enorme população pobre. Os principais portos foram controlados por administrações imperialistas ocidentais e o campo passou ao jugo de violentos e corruptos caudilhos. O ópio inglês escravizou milhões.

Acadêmicos britânicos: apologistas eloquentes pela conquista imperialista

Toda profissão acadêmica ocidental – sobretudo os historiadores do imperialismo britânico – atribuíram o domínio imperialista inglês da Ásia à “superioridade tecnológica”, à miséria da China e o status colonial ao “atraso oriental”, omitindo qualquer menção ao milênio do progresso técnico e comercial chinês, com sua superioridade até o alvorecer do século XIX. Pelo fim dos anos de 1920, com a invasão imperialista japonesa, a China deixou de existir como país unificado. Sob a égide da lei imperialista, centenas de milhões de chineses passaram fome, foram desapropriados ou assassinados, assim como os poderes do ocidente e do Japão saquearam sua economia. A elite chinesa “colaboradora” entreguista foi desmoralizada diante do povo chinês.

O que permaneceu na memória coletiva de grandes contingentes do povo chinês – e o que estava totalmente ausente das considerações de prestigiosos acadêmicos ingleses e estadunidenses – foi o fato de a China ter sido uma vez uma potência global próspera e dinâmica. Comentaristas ocidentais descartaram essa memória coletiva da ascensão da China como se fossem pretensões tolas de uma realeza e uma nobreza nostálgicas – como arrogância Han sem sentido.

A China levanta das cinzas da humilhação e do saqueio imperialista: a Revolução Comunista Chinesa

A ascensão da China moderna para se tornar a segunda maior economia do mundo foi possível apenas através do sucesso da revolução comunista chinesa na metade do século XX. O Exército “Vermelho” de Libertação Popular derrotou primeiramente o exército invasor imperialista japonês e posteriormente o exército “nacionalista” liderado pelo Kuomintang e sustentado pelo imperialismo dos EUA. Isso permitiu a reunificação da China como Estado soberano independente. O governo comunista aboliu os privilégios extraterritoriais dos imperialistas ocidentais, acabaram com os feudos dos caudilhos e gângsteres regionais e expulsaram os milionários proprietários de bordéis, traficantes de mulheres e de drogas, bem como outros “provedores de serviços” para o império euro-estadunidense.

No pleno sentido do termo, a revolução comunista forjou o moderno Estado chinês. Os novos líderes começaram então a reconstruir uma economia arrasada pelas guerras imperialistas e pela pilhagem ocidental e dos capitalistas japoneses. Depois de 150 anos de infâmia e humilhação, o povo chinês recuperou seu orgulho e dignidade nacional. Esses elementos sociopsicológicos foram essenciais na motivação dos chineses na defesa de seu país contra os ataques, sabotagens, boicotes e bloqueios dos EUA, montados imediatamente após a libertação.

Ao contrário do que afirmam economistas chineses e ocidentais neoliberais, o crescimento dinâmico da China não começou em 1980. Teria começado em 1950, quando a reforma agrária proveu terra, infraestrutura, crédito e auxílio técnico a centenas de milhões de camponeses e trabalhadores rurais sem-terra e despossuídos. Através do que hoje é chamado “capital humano” e gigantesca mobilização social, os comunistas construíram estradas, aeroportos, pontes, canais e linhas férreas, assim como as indústrias de base, como de carvão, ferro e aço, para formar a coluna vertebral da moderna economia chinesa. Os vastos sistemas comunistas chineses de saúde e educação gratuitos criaram uma força de trabalho motivada, saudável e instruída. Seus militares altamente profissionais impediram que os EUA expandissem seu império militar através da península coreana até as fronteiras do território chinês. Assim como os velhos scholars e propagandistas ocidentais fabricaram uma história de um império “estagnado e decadente” para justificar sua conquista destrutiva, também seus equivalentes modernos têm reescrito a história dos primeiros 30 anos da história comunista chinesa, negando o papel da revolução no desenvolvimento de todos os elementos essenciais para uma economia, Estado e sociedade modernos. Está claro que o rápido crescimento econômico da China, baseado no desenvolvimento de seu mercado interno, no rápido crescimento de seu quadro científico, em técnicos e trabalhadores qualificados, na rede de segurança social que protegeu e promoveu a mobilidade da classe trabalhadora e camponesa, foram produzidos pelos investimentos e planejamentos comunistas.

O avanço da China rumo ao poder global começou em 1949, com a expulsão de todas as camadas parasitárias entreguistas, especuladoras e financeiras que serviram de intermediárias para imperialistas europeus, japoneses e estadunidenses, que drenaram grandes riquezas da China.

A transição da China para o capitalismo

A partir de 1980, o governo chinês iniciou uma guinada drástica em sua estratégia econômica: através das três décadas seguintes, ele abriu o país para investimentos estrangeiros em larga escala; privatizou milhares de indústrias e isso colocou em movimento um processo de concentração de renda baseado numa estratégia deliberada de criar novamente uma classe dominante de bilionários ligados aos capitalistas estrangeiros. A classe política dominante na China abraçou a ideia de tomar emprestado o know how técnico e o acesso aos mercados estrangeiros de firmas internacionais em troca de disponibilizar trabalho barato e abundante, com o custo mais baixo possível.

O Estado chinês redirecionou grande quantidade de subsídios públicos para promover alto crescimento capitalista através do desmantelamento de seu sistema nacional de educação pública gratuita e assistência à saúde. Eles terminaram com as habitações públicas subsidiadas para centenas de milhões de camponeses e trabalhadores fabris urbanos e concederam fundos para especuladores imobiliários para a construção de apartamentos privados de luxo e arranha-céus comerciais. A nova estratégia capitalista da China, bem como seu crescimento de dois dígitos, foram baseados em profundas mudanças estruturais e amplos investimentos públicos tornados possíveis pelo governo comunista anterior. A decolagem do setor privado da China foi baseada em grandes gastos públicos efetuados desde 1949.

A nova classe capitalista triunfante e seus colaboradores do ocidente reivindicaram todo o crédito pelo seu “milagre econômico”, uma vez tendo a China ascendido à condição de segunda maior economia do mundo. Essa nova elite chinesa tem sido menos apressada para anunciar a condição da China em termos da brutal desigualdade de classes, rivalizando apenas com os EUA.

China: da dependência imperialista a competidor mundial

O crescimento sustentado da China no seu setor manufatureiro foi resultado de investimentos públicos altamente concentrados, altos lucros, inovações tecnológicas e um mercado doméstico protegido. Enquanto ocapital estrangeiro lucrava, isso ocorria sempre dentro da plataforma das prioridades do Estado chinês e suas regulamentações. A dinâmica do regime de “estratégia exportadora” levou a enormes superavitcomerciais, que eventualmente fizeram da China um dos maiores credores mundiais, especialmente da dívida dos EUA. Tendo por objetivo manter suas indústrias dinâmicas, a China demandou amplos influxos de matérias-primas, resultando em investimentos internacionais de larga escala e acordos comerciais com países de exportação agromineral na África e América Latina. Em 2010, a China deslocou os EUA e a Europa da condição de principal parceiro comercial de muitos países na Ásia, África e América Latina.

A ascensão da China moderna como potência econômica mundial, como sua predecessora entre 1100 e 1800, está baseada em sua gigantesca capacidade produtiva: comércio e investimento foram governados por uma estrita política de não interferência nas relações internas de seus parceiros comerciais. Diferentemente dos EUA, a China não iniciou guerras brutais por petróleo; em vez disso, assinou contratos lucrativos. E a China não faz guerras pelos interesses de chineses no estrangeiro, como os EUA têm feito no Oriente Médio por Israel.

O aparente desequilíbrio entre o poder econômico e militar chineses está em gritante contraste com os EUA, onde um império militar inchado e parasitário continua a erodir a sua própria presença econômica global.

O gasto militar dos EUA é vinte vezes o da China. Cada vez mais os militares dos EUA desempenham um papel-chave na definição das políticas de Washington na tentativa de impedir a ascensão da China como potência global.

A ascensão da China como potência global: a história vai se repetir?

A China tem crescido cerca de 9% por ano e seus bens e serviços estão aumentando rapidamente a qualidade e o valor. Em contrapartida, os EUA e a Europa têm afundado em cerca de 0% de crescimento de 2007 a 2012. O contexto técnico-científico inovador da China assimila constantemente as últimas invenções do ocidente (e Japão) e as aperfeiçoa, reduzindo assim o custo de produção. A China substituiu as “instituições financeiras internacionais” controladas pelos EUA e Europa (FMI, Banco Mundial e Banco Interamericano de Desenvolvimento) como principal credor na América Latina. A China continua a liderar como primeiro investidor nos recursos de energia e mineração na África. A China substituiu os EUA como principal mercado para o petróleo da Arábia Saudita, Sudão e Irã, com perspectiva de logo tomar a posição dos EUA como principal mercado para derivados de petróleo da Venezuela. Hoje, a China é o maior produtor de bens industrializados e o maior exportador do mundo, dominando até mesmo o mercado estadunidense, enquanto desempenha seu papel no mercado financeiro, detendo mais de 1,3 trilhão de dólares em títulos do Tesouro dos EUA.

Sob crescente pressão de seus trabalhadores e agricultores, os governantes chineses têm desenvolvido o mercado doméstico com aumentos de salários e gastos sociais para equilibrar a economia e evitar o espectro da instabilidade social. Em contraste, a renda nos EUA, os salários e os serviços públicos vitais têm caído vertiginosamente em termos absolutos e relativos.

Dadas as atuais tendências históricas, está claro que a China vai assumir o lugar dos EUA como potência econômica mundial na próxima década, isso se os EUA não revidarem e se as profundas desigualdades de classe na China não produzirem maiores convulsões sociais.

A ascensão da China moderna como poder global enfrenta sérios desafios. Em contraste com a ascensão histórica da China em nível mundial, o poder econômico mundial da China moderna não está sendo acompanhado por nenhuma concorrência imperialista. Contudo, a China ficou seriamente defasada com relação aos EUA e à Europa na capacidade de promover guerras. Essa opção pode ter permitido que a China direcionasse recursos públicos para maximizar o crescimento econômico, mas isso deixou o país vulnerável diante da superioridade militar dos EUA com seu enorme arsenal, sua rede de postos avançados e bases militares em posições estratégicas, próximas da costa chinesa e territórios adjacentes.

No século XIX, o imperialismo britânico demoliu a posição global da China com sua superioridade militar, tomando seus portos – por reconhecer a dependência da Inglaterra à China com relação à sua “superioridade mercantil”.

A conquista da Índia, Birmânia e a maior parte da Ásia permitiu à Inglaterra estabelecer bases coloniais e recrutar exércitos mercenários locais. A Inglaterra e seus aliados mercenários cercaram e isolaram a China, criando as condições para uma grave perturbação dos mercados chineses e a imposição de condições comerciais brutais. A presença armada do império britânico determinava o que a China importava (com o ópio contabilizando mais de 50% das exportações da Inglaterra nos anos de 1850), enquanto minava as vantagens competitivas da China com políticas tarifárias.

Hoje em dia, os EUA estão tentando políticas semelhantes: a frota naval dos EUA patrulha e controla as linhas de navegação chinesas e os recursos de petróleo do exterior através de suas bases marítimas. A Casa Branca de Obama-Clinton está em processo de desenvolver uma rápida resposta militar envolvendo suas bases na Austrália, Filipinas e outros lugares da Ásia. Os EUA estão intensificando seus esforços para abalar o acesso chinês a recursos estrangeiros estratégicos enquanto sustentam separatistas e “insurgentes” no oeste da China, Tibete, Sudão, Birmânia, Irã, Líbia, Síria e outros lugares. Os acordos militares dos EUA com a Índia e a instalação de um regime fantoche no Paquistão são avanços na estratégia de isolar a China. Enquanto a China sustenta sua política de “desenvolvimento harmonioso” e “não interferência nos negócios estrangeiros de outros países”, o imperialismo dos EUA e da Europa atacaram uma série de parceiros comerciais da China para basicamente reverter a pacífica expansão comercial chinesa.

A carência de estratégia política e ideológica da China para proteger seus interesses econômicos no exterior tem sido um convite aos EUA e à OTAN para erigir regimes hostis à China. O exemplo mais marcante é a Líbia, quando os EUA e a OTAN intervieram para depor um governo independente liderado pelo presidente Kadafi, com quem a China havia assinado acordos de investimentos e comerciais de muitos bilhões de dólares. O bombardeio da OTAN nas cidades da Líbia, nos portos e instalações petrolíferas, forçou a China a retirar 35 mil engenheiros de petróleo e trabalhadores de construção em questão de dias. A mesma coisa aconteceu no Sudão, onde a China investiu bilhões para desenvolver sua indústria de petróleo. Os EUA, Israel e a Europa armaram os rebeldes sudaneses do Sul para romper o fluxo de petróleo e atacar os trabalhadores chineses.6 Nos dois casos, a China permitiu passivamente que os militares imperialistas dos EUA e da Europa atacassem seus parceiros comerciais e sabotassem seus investimentos.

Sob Mao Tse-tung, a China teve uma política ativa contra a agressão imperialista: ela sustentou movimentos revolucionários e governos independentes no terceiro mundo. A China capitalista de hoje não tem tido uma política ativa de apoio a governos ou movimentos capazes de proteger o comércio bilateral chinês e seus acordos de investimento. A inabilidade chinesa para confrontar a agressão militar contra seus interesses econômicos é devida a profundos problemas estruturais. A política exterior da China é orientada por grandes interesses comerciais, financeiros e industriais que contam apenas com suas “margens econômicas de competitividade” para ganhar fatias crescentes de mercados, não tendo a devida compreensão a respeito dos fundamentos militares do sistema econômico mundial. A classe política da China é profundamente influenciada por uma nova classe de bilionários que possuem laços fortes com os fundos de capitais ocidentais e que tem absorvido acriticamente os valores culturais do ocidente. Isso é ilustrado pela sua preferência a enviar seus próprios filhos para universidades de elite nos EUA e Europa. Eles procuram “adequação ao ocidente” a qualquer preço.

Essa falta de qualquer entendimento estratégico a respeito da construção militar de um império os tem conduzido a responder de maneira ineficaz e ad hoc a cada ação imperialista que vise minar seu acesso a recursos ou mercados. A perspectiva de “negócios em primeiro lugar” da China parece ter funcionado enquanto o país era um jogador menor no tabuleiro econômico mundial e os imperialistas dos EUA viam na “abertura capitalista” uma chance de facilmente capturar as empresas públicas da China e saquear sua economia. Contudo, quando a China (ao contrário da antiga URSS) decidiu reter controles de capitais e desenvolver uma “política industrial” cuidadosamente controlada e dirigida pelo Estado, direcionando o capital ocidental e a transferência de tecnologia para empresas estatais, que efetivamente penetraram nos mercados domésticos e estrangeiros dos EUA, Washington começou a reclamar e falou em retaliação.

Os enormes superavit comerciais da China com os EUA provocaram uma resposta dupla em Washington: eles venderam massivas quantidades de títulos do Tesouro dos EUA para os chineses e começaram a desenvolver uma estratégia global para bloquear o avanço da China. Desde que os EUA viram declinar sua influência econômica, para reverter o processo, eles se ativeram à sua única “vantagem comparativa” – sua superioridade militar baseada num sistema mundial de bases de ataque, uma rede internacional de regimes-clientes, representações militares, ONGs, intelectuais e mercenários armados. Washington voltou-se para seus aparatos militares ostensivos e clandestinos para sabotar os parceiros comerciais da China. Washington depende de antigos laços com governantes corruptos, dissidentes, jornalistas e magnatas da mídia para promover sua poderosa proteção de propaganda, enquanto avançam sua ofensiva militar contra os interesses da China ao redor do mundo.

A China não tem nada comparável ao “aparato de segurança” internacional dos EUA, pois pratica a política da “não interferência”. Dado o estado avançado da ofensiva imperialista ocidental, a China tem tomado apenas algumas iniciativas diplomáticas, tal como financiar meios de comunicação em língua inglesa para apresentar sua perspectiva, usando seu poder de veto no Conselho de Segurança da ONU para se opor aos esforços dos EUA para derrubar o regime independente de Assad, na Síria, e se opor às imposições de sanções drásticas contra o Irã. Ela repudiou seriamente o questionamento ácido da secretária de Estado estadunidense Hilary Clinton a respeito da “legitimidade” do Estado chinês quando este votou contra a resolução dos EUA-ONU de preparar um ataque na Síria.7

Estrategistas militares chineses estão mais atentos e alarmados a respeito da crescente ameaça militar contra a China. Eles têm exitosamente solicitado um aumento anual de 19% nos gastos militares nos próximos cinco anos (2011-2015).8 Mesmo com esse aumento, as despesas militares da China vão continuar abaixo de um quinto do orçamento militar dos EUA e a China não tem sequer uma base militar estrangeira, em gritante contraste com as mais de 750 instalações estrangeiras dos EUA. As operações da inteligência chinesas no exterior são mínimas e ineficazes. Suas embaixadas são dirigidas por e para os interesses estritamente comerciais, que claramente falharam na compreensão da política violenta da OTAN para mudar o regime na Líbia e na necessidade de informar Pequim a respeito de sua significação para o Estado chinês.

Há ainda outras duas fraquezas estruturais que prejudicam a ascensão da China como potência mundial. Trata-se da altamente “ocidentalizada” intelligentsia que tem engolido de maneira acrítica a doutrina econômica dos EUA a respeito dos livre-mercados, enquanto ignoram a militarização da sua economia. Esses intelectuais chineses repetem como papagaios a propaganda da doutrina econômica dos EUA a respeito das “virtudes democráticas” das campanhas presidenciais de bilhões de dólares, enquanto sustentam a desregulamentação financeira que teria levado Wall Street a adquirir bancos e reservas chinesas. Muitos consultores financeiros e acadêmicos chineses foram educados nos EUA e foram influenciados pelos seus vínculos com acadêmicos estadunidenses e instituições financeiras internacionais diretamente ligadas a Wall Street e Londres. Eles prosperaram como executivos de alta renda, recebendo prestigiosas posições em instituições chinesas. Eles identificam a “liberalização dos mercados financeiros” com “economias avançadas” capazes de aprofundar laços com os mercados globais, em vez de atuarem como fontes da atual crise financeira. Esses “intelectuais ocidentalizados” são como seus homólogos entreguistas do século XIX, que subestimaram e rejeitaram as consequências de longo prazo da penetração imperialista ocidental. Eles não conseguem entender como a desregulamentação financeira nos EUA precipitou a atual crise e como a desregulamentação levaria a uma captura do sistema financeiro da China pelo ocidente – o que teria como consequência a realocação das reservas domésticas da China para atividades nãoprodutivas (especulação financeira), precipitando a crise financeira e finalmente comprometendo a posição de liderança global da China.

Esses yuppies imitam o que há de pior nos estilos de vida consumistas do ocidente e suas posições políticas são guiadas por esses estilos de vida e por identidades ocidentalizadas que impedem qualquer sentido de solidariedade com a sua própria classe trabalhadora.

Existe uma base econômica para os sentimentos pró-ocidente nos neoentreguistas da China. Eles transferiram bilhões de dólares para contas bancárias estrangeiras, compraram mansões e apartamentos de luxo em Londres, Toronto, Los Angeles, Manhattan, Paris, Hong Kong e Singapura. Eles têm um pé na China (a sua fonte de riqueza) e outro no ocidente (onde consomem e guardam sua riqueza).

Os entreguistas ocidentalizados estão plenamente integrados ao sistema econômico chinês, tendo laços familiares com as lideranças políticas na estrutura partidária e no Estado. Suas conexões são mais fracas entre militares e nos crescentes movimentos sociais, apesar de alguns estudantes “dissidentes” e ativistas acadêmicos nos “movimentos democráticos” serem patrocinados por ONGs imperialistas do ocidente. Na medidaem que os entreguistas ganham influência, enfraquecem as fortes instituições econômicas do Estado que dirigiu a elevação da China à condição de potência, assim como fizeram no século XIX como agentes intermediários do império britânico. Anunciando o “liberalismo” do século XIX, o ópio britânico viciou mais de 50 milhões de chineses em menos de uma década. Anunciando “democracia e direitos humanos”, os barcos militares dos EUA agora patrulham a costa da China. A ascensão da China à potência mundial dirigida pela elite gerou desigualdades monumentais entre milhares de novos bilionários e multimilionários no topo e centenas de milhões de trabalhadores empobrecidos, camponeses e trabalhadores imigrantes na base.

A rápida acumulação de riqueza e capital da China foi possível através da intensa exploração de seus trabalhadores, que foram retirados de suas redes de proteção social e das suas condições de trabalho regulamentado anteriormente vigentes sob o comunismo. Milhões de famílias chinesas estão sendo desapropriadas em razão de se promoverem e desenvolverem especuladores imobiliários que então constroem altos prédios de escritórios e apartamentos de luxo para as elites domésticas e estrangeiras. Esses aspectos brutais do crescente capitalismo chinês criaram uma fusão entre o local de trabalho e um espaço ativo de lutas de massas que está crescendo a cada ano. O slogan empreendedor-especulador “enriquecer é maravilhoso” perdeu seu poder de iludir o povo. Em 2011, existiam mais de 200 mil vilas rurais e fábricas populares no entorno urbano.

O próximo passo, que certamente virá, será a unificação dessas lutas em novos movimentos sociais nacionais com uma agenda classista que exigirá a restauração dos serviços de saúde e educação de que se gozava durante o período dos comunistas, assim como uma melhor distribuição da riqueza da China. Demandas atuais por melhor renda podem se converter em demandas por uma maior democracia nos locais de trabalho. Para responder a essas novas demandas populares, os novos liberais entreguistas e ocidentalizados da China não podem indicar como “modelo” os EUA, uma vez que os trabalhadores estadunidenses estão tendo seus benefícios retirados, enquanto que os chineses lutam para reconquistá-los.

A China, cindida por crescentes conflitos políticos e de classe, não pode sustentar sua continuidade rumo à liderança econômica mundial. A elite chinesa não pode confrontar a ameaça militar imperialista crescente dos EUA com seus aliados entreguistas entre as elites liberais internas, enquanto o país é uma sociedade profundamente dividida com uma classe trabalhadora de hostilidade crescente. A época da exploração indiscriminada do trabalho chinês tem que acabar para encarar o cerco militar estadunidense à China, bem como os ataques econômicos nos seus mercados estrangeiros. A China tem enormes recursos. Com mais de 1,5 trilhão de dólares em reservas, a China pode financiar programas abrangentes de saúde e educação públicas através do país.

A China pode bancar a obtenção de um intensivo “programa público de habitação” para os 250 milhões de trabalhadores migrantes atualmente vivendo em condições de miséria. A China pode impor um sistema de tributação de renda progressiva sobre seus novos bilionários e milionários, financiando pequenas propriedades rurais, cooperativas familiares e indústrias rurais para reequilibrar a economia. Seu programa para desenvolver fontes alternativas de energia – como painéis solares e fazendas de energia eólica – são um começo promissor para mitigar sua grave poluição do meio-ambiente. A degradação ambiental e os problemas de saúde relacionados já mobilizam a preocupação de dezenas de milhões.

Atualmente, a melhor defesa da China contra as interferências imperialistas seria um regime estável baseado na justiça social para centenas de milhões e uma política externa de apoio a movimentos anti-imperialistas no estrangeiro – para quem a independência é um interesse vital da China. É necessária uma política pró-ativa baseada em parcerias de benefício mútuo, incluindo solidariedade militar e diplomática. Um ainda pequeno, mas influente, grupo de intelectuais chineses tem levantado a questão do crescimento da ameaça militar estadunidense e estão “dizendo não à diplomacia dos navios de guerra”.9

A China moderna tem plenos recursos e oportunidades, então inexistentes na China do século XIX quando estava subjugada pelo império britânico. Se os EUA continuarem a incrementar sua política militarista agressiva contra a China, Pequim pode dar início a uma séria crise fiscal por meio do despejo de algumas das centenas de bilhões de dólares do Tesouro estadunidense que detém.

A China, uma potência nuclear, deveria se aproximar de sua similarmente armada e ameaçada vizinha Rússia, para confrontar e atrapalhar os devaneios bélicos da secretária de Estado dos EUA, Hilary Clinton. O futuro presidente da Rússia, Putin, promete que vai aumentar os gastos militares de 3% para 6% do PIB durante a próxima década, para se contrapor à ofensiva de Washington e suas bases de mísseis nas fronteiras da Rússia, bem como para contrariar os programas de “mudança de regime” de Obama contra seus aliados, como a Síria.10

A China tem poderosas redes econômicas, de comércio e investimentos ao redor do globo, bem como poderosos parceiros econômicos. Essas ligações têm se tornado essenciais para o crescimento continuado de muitos países ao redor do mundo em desenvolvimento. Ao confrontar a China, os EUA terão que enfrentar a oposição de muitas elites econômicas poderosas ao redor do mundo. Poucos países ou elites vêem algum futuro no atrelamento de suas fortunas a um império economicamente instável baseado no militarismo e em ocupações colonialistas destrutivas.

Em outros termos, a China moderna, uma potência mundial, é incomparavelmente mais forte do que já foi no início do século XVIII. Os EUA não têm a influência econômica que o ascendente império britânico possuía nas guerras pelo ópio. Além disso, muitos intelectuais chineses e a larga maioria dos cidadãos não têm a intenção de deixar esse grupo de “entreguistas ocidentalizados” vender o país. Nada agravaria mais a polarização política na sociedade chinesa e aceleraria a vinda de uma segunda revolução social na China do que uma liderança tímida submetida a uma nova era de pilhagem pelo imperialismo ocidental.

Notas

1. John Hobson, The Eastern Origins of Western Civilization (Cambridge UK : Cambridge University Press, 2004).

2. Ibidem, Ch. 9, pp. 190-218.

3. Ibidem, Ch. 11, pp. 244-248.

4. Richard Gott, Britain’s Empire: Resistance, Repression and Revolt (London: Verso 2011) Para uma crônica histórica detalhada da selvageria que acompanhou o império colonial britânico.

5. Hobson, pp. 253-256.

6. Katrina Manson, “South Sudan puts Beijing ’s policies to the test”, Financial Times, 21/2/2012, p. 5.

7. Entrevista de Clinton NPR, 26/2/2012.

8. La Jornada, 15/2/2012 (Mexico City).

9. China Daily (20/2/2012).

10. Charles Clover, “Putin vows huge boost in defense spending”, Financial Times, 12/2/2012.

Tradução: PCB (Partido Comunista Brasileiro)

Custos do trabalho e produtividade em Portugal e nos países da UE

Custos do trabalho e produtividade em Portugal e nos países da UE

– O agravamento das desigualdades e da recessão económica provocada pela cegueira em reduzir ainda mais os salários

por Eugénio Rosa [*]

Uma das afirmações mais repetidas em Portugal, nomeadamente pelo governo e pela “troika estrangeira”, assim como pelos patrões e pelos defensores do pensamento económico neoliberal dominante nos media é a baixa produtividade do trabalho em Portugal. E para isso comparam a produtividade portuguesa com a de outros países da UE. No entanto, nunca comparam os salários dos portugueses com os dos outros países da UE. E a partir daquela afirmação, que se transformou num lugar comum dos ultraliberais (as causas nunca são profunda e honestamente analisadas) insinua-se ou afirma-se mesmo que a culpa é dos trabalhadores e que estes recebem salários que não correspondem à produtividade que têm. E com base nisso aparece a estranha teoria de que, para aumentar a produtividade e a competitividade, das empresas, é necessário baixar os salários em Portugal entre 15% e 20%. E é esse um objectivo das medidas que a “troika estrangeira” e o governo PSD/CDS estão a impor aos trabalhadores portugueses através do congelamento e mesmo corte de salários, por meio da destruição do emprego e consequente disparar do desemprego que depois é utilizado para pressionar os trabalhadores a aceitarem salários cada vez mais baixos, por meio das alterações na lei do subsidio de desemprego (redução do valor e da duração) para obrigar os desempregados a aceitarem salários inferiores aos que recebiam antes de serem despedidos, por meio do aumento do trabalho gratuito (redução das férias e dos feriados) etc. Actualmente, já mais de 10,5% dos trabalhadores portugueses, ou seja, 500.000 recebem apenas o salário mínimo nacional, e este número está a crescer de uma forma rápida (entre Out/2007 e Out/2010 aumentou em 75%). E se retirarmos ao salário mínimo o desconto para a Segurança Social (11%) restam 431,65€ um valor próximo do limiar da pobreza.

Esta estranha teoria de que se se impuserem salários ainda mais baixos em Portugal a produtividade e a competitividade aumentarão não tem correspondência real. E isto porque os custos do trabalho em Portugal já são significativamente inferiores aos médios da União Europeia e esse facto nunca resolveu o problema da baixa competitividade das empresas portuguesas. O quadro 1, construído com dados recentemente divulgados pelo Eurostat, mostra que os custos do trabalho em Portugal já são bastante inferiores aos da União Europeia.

Quadro 1- Custos do trabalho em Portugal e na União Europeia no período 2008/2011 

PAÍSES CUSTOS DO TRABALHO POR HORA EM EUROS
ECONOMIA INDÚSTRIA
2008 2009 2010 2011 2008 2009 2010 2011
EU-27 21,60 € 22,10 € 22,50 € 23,10 € 21,80 € 22,50 € 22,70 € 23,50 €
Bélgica 35,60 € 37,00 € 38,20 € 39,30 € 36,70 € 38,10 € 39,50 € 40,50 €
Alemanha 28,40 € 29,00 € 29,10 € 30,10 € 32,30 € 32,90 € 32,80 € 34,20 €
Espanha 18,90 € 20,00 € 20,20 € 20,60 € 20,30 € 21,50 € 21,70 € 21,90 €
Portugal 11,50 € 11,90 € 12,00 € 12,10 € 9,80 € 10,10 € 10,30 € 10,30 €
Portugal/UE27 53,2% 53,8% 53,3% 52,4% 45,0% 44,9% 45,4% 43,8%
Portugal/Bélgica 32,3% 32,2% 31,4% 30,8% 26,7% 26,5% 26,1% 25,4%
Portugal/Alemanha 40,5% 41,0% 41,2% 40,2% 30,3% 30,7% 31,4% 30,1%
Portugal/Espanha 60,8% 59,5% 59,4% 58,7% 48,3% 47,0% 47,5% 47,0%

Fonte: Labor cost índex – recente trends – March 2012 – Eurostat

Assim segundo o Eurostat, em 2011, o custo do trabalho por hora em Portugal, para toda a economia (não incluía a Administração Pública) correspondia a 52,4% do custo médio da União Europeia; a 30,8% do custo da hora do trabalho na Bélgica; a 40,2% do custo da hora de trabalho da Alemanha; e a 58,7% do custo da hora do trabalho na Espanha.

Se a comparação entre Portugal e os países da União Europeia for feita com os custos do trabalho na indústria, as percentagens obtidas ainda são mais baixas para Portugal. Assim, também em 2011, e de acordo também com o Eurostat, os custos do trabalho por hora na indústria em Portugal correspondiam apenas 43,8% da média dos países da União Europeia; a 25,4% dos da Bélgica; a 30,1% dos Alemanha, e a 47% dos da Espanha.

E tenha-se presente que os custos do trabalho não correspondem na sua totalidade aos salários recebidos pelos trabalhadores. E isto porque os custos do trabalho para além de incluírem os salários, também incluem as contribuições patronais para a Segurança Social, as remunerações e despesas dos administradores, etc., e também as indemnizações por despedimentos em cada ano.

Afirmar como diz o governo e a “troika estrangeira”, assim como os seus “amigos” estrangeiros e os seus defensores internos nos media, que são os custos do trabalho em Portugal a causa da baixa competitividade das empresas e da economia portuguesa é mais uma mentira. Ela insere-se numa campanha que visa condicionar e manipular a opinião publica com o objectivo de levar esta a aceitar passivamente, como inevitável, a terapia de choque ultraliberal que está a ser imposta a Portugal e a conduzir a economia e a sociedade portuguesa para o abismo.

Por outro lado, se compararmos os níveis de produtividade em Portugal com os dos outros países da UE, e se os relacionarmos com os custos do trabalho anteriores, fica claro mais uma mentira da campanha de manipulação da opinião pública que está em curso no nosso país. Para isso interessa analisar os dados do quadro 2, sobre a produtividade da mão-de-obra por empregado, que foram calculados com base em dados divulgados também pelo Eurostat.

Quadro 2 – Percentagem que a produtividade da mão-de-obra por empregado em Portugal representa em relação à dos países da UE 

PAÍSES 2007 2008 2009 2010
Portugal/UE27 74,0% 73,5% 75,8% 76,5%
Portugal/Bélgica 58,0% 58,0% 59,5% 60,0%
Portugal/Alemanha 68,3% 68,1% 72,3% 72,6%
Portugal/Espanha 71,8% 70,5% 69,0% 70,2%

Fonte: Eurostat, Produtivité de la main d´ouvre par personne ocupée

Em 2010, a produtividade da mão-de-obra por empregado em Portugal, correspondia a 76,5% da produtividade média da União Europeia, enquanto os custos do trabalho por hora em Portugal correspondiam, como se referiu anteriormente, apenas a 45,4% dos da União Europeia; no mesmo ano. Em relação aos outros países do quadro 2 a relação era a seguinte: a produtividade por empregado em Portugal era 60% da produtividade da Bélgica, enquanto os custos de trabalho eram apenas 26,1% dos da Bélgica; em relação à Alemanha, a produtividade média em Portugal correspondia 72,6% da alemã, mas o custo de trabalho por hora em Portugal correspondia apenas 31,4% do custo do trabalho por hora na Alemanha; finalmente, a produtividade por empregado em Portugal era 70,2% da de Espanha, mas o custo do trabalho por hora em Portugal correspondia apenas a 47,5% do custo do trabalho por hora em Espanha. Portanto, existe uma grande diferença, em prejuízo dos trabalhadores portugueses, entre a produtividade em Portugal quando a comparamos com a dos outros países da União Europeia e os custos do trabalho, que incluem os salários pagos, quando fazemos idênticas comparações com as dos outros países da União Europeia. Em Portugal os salários em percentagem dos salários médios da União Europeia estão muito abaixo da percentagem que a produtividade portuguesa representa em relação à produtividade média dos países da UE.

Os dados anteriores, que são oficiais pois são os divulgados pelo Eurostat, para além de revelar um nível de exploração do trabalho em Portugal muito superior ao nível de exploração na União Europeia, também provam, de uma forma quantificada, que não o nível de salários em Portugal a causa da baixa produtividade e competitividade das empresas e da economia portuguesa. Prosseguir este caminho como o governo PSD/CDS e a “troika estrangeira” estão empenhados só agravará a crise económica e social ainda mais em Portugal, aumentando a exploração dos trabalhadores, agravando ainda mais as desigualdades, e atirando o país para uma recessão económica ainda mais prolongada e profunda. E isto porque, como afirma mesmo Robert Reich, ex- secretário de Estado do presidente Clinton, em Aftershoc – A economia que se segue e o futuro da América, “Quando o rendimento está concentrado em relativamente poucas mãos, a procura global de bens e serviços contrai-se porque os muito ricos não gastam nem de perto tudo o que ganham. As poupanças deles são acumuladas, para circularem numa fúria de especulação ou, sobretudo nos nossos tempos, para serem investidos no estrangeiro”. Em Portugal com redução dos salários dos trabalhadores e com a destruição da classe média está-se a verificar uma aceleração rápida deste processo de concentração da riqueza em poucas mãos em que as privatizações a saldo e a protecção fiscal dos mais ricos são as faces mais visíveis e chocantes.

18/Março/2012

[*] Economista, edr2@netcabo.pt 

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .

Frota de submarinos. Pode ser muito para alguns, mas não para a Rússia

Frota de submarinos. Pode ser muito para alguns, mas não para a Rússia

A Rússia celebra hoje o Dia do Submarinista. A frota de submarinos da Marinha russa está em uma situação difícil. Os próximos anos irão determinar o desempenho do programa nacional de armamentos e são críticos para o seu futuro.

Foto: RIA Novosti

O primeiro porta-mísseis do projeto 955 Borey, o submarino K-535 Yuri Dolgoruky, entrará em serviço na primavera-verão de 2012. O segundo, o K-550 Alexander Nevsky, estará pronto no outono. Também no outono se espera o lançamento do terceiro submarino, o Vladimir Monomakh. Ainda este ano deverá oficialmente começar a construção do quarto submarino estratégico.

O ritmo de construção está aumentando. O Yuri Dolgoruky levou 17 anos a entrar em serviço desde o início de sua construção. Para Alexander Nevsky e Vladimir Monomakh, este prazo será já de 8 anos.

A parte naval do escudo nuclear da Rússia está bastante bem equipada. No entanto, o que falta à Marinha russa hoje são submarinos multiuso, capazes de operar em diferentes condições e necessários para apoiar seus próprios submarinos estratégicos e destruir as embarcações inimigas.

“Pode ser muito para alguns, mas não para a Rússia” – é assim que se deve caracterizar o programa de construção de submarinos multiuso nucleares e a diesel para a Marinha russa. Ainda na atual década, a Marinha receberá entre 8 e 10 submarinos a diesel e 10 submarinos nucleares multiuso do projeto 885 Yasen.

Hoje, a Marinha russa possui 27 submarinos nucleares multiuso, dos quais não mais de 10-12 navios dos projetos 949A Antey (classe Oscar II) e 971 Schuka-B (classe Akula) poderão realmente continuar em serviço depois de 2020.

Como resultado, a frota perderá entre 26 e 30 dos 50 submarinos multiuso disponíveis, recebendo não mais de 20 em troca. O défice de 6-10 navios, possivelmente, não seria muito crítico, mas o seu número ainda hoje é extremamente insuficiente, especialmente considerando que muitos dos submarinos estão sendo reparados ou esperando reparação.

Entre as áreas principais onde a Marinha russa necessita de novos submarinos está o Extremo Oriente russo. Aqui é necessário considerar o potencial da Marinha do Japão que possui 18 submarinos modernos a diesel e que regularmente atualiza a sua frota de submarinos. A Marinha japonesa possui também modernas forças de superfície e aviões anti-submarino. A Frota russa do Pacífico é inferior à japonesa em quantidade e as forças de submarinos nestas condições são um dos mais importantes meios de manter o equilíbrio. Formalmente, a Frota do Pacífico também tem 18 submarinos multiuso nucleares e a diesel, mas uma parte significativa deles não estão aptos para combate. A Frota do Pacífico simplesmente não tem navios com menos de 15 anos. Para efeito de comparação, dos 18 submarinos japoneses, 15 entraram em serviço nos últimos 15 anos.

É possível compensar este défice mas isso requer um grande programa de reparação completa e modernização, bem como a construção mais intensiva de submarinos modernos – tanto nucleares como a diesel.

Reforma das Forças Armadas da Rússia está quase concluída

Reforma das Forças Armadas da Rússia está quase concluída


A reforma das Forças Armadas russas está praticamente concluída. As FA se tornaram mais capazes de enfrentar as ameaças de guerra moderna, declarou o presidente Dmitri Medvedev em uma reunião do conselho consultivo alargado do Ministério da Defesa em Moscou.

O presidente observou que, de 2008 a 2011, a quota-parte de moderno equipamento militar  nas Forças Armadas aumentou consideravelmente e que a intensidade do treinamento de combate e operacional triplicou.

O presidente garantiu que a defesa nacional será financiada significativamente até 2020. Sublinhou que “a segurança dos nossos cidadãos, do nosso país e dos nossos aliados precisa de uma protecção garantida.”

Rússia dará resposta à DAM norte-americano

Discursando em reunião ampliada do Colégio do Ministério da Defesa, o Presidente da Rússia, Dmitri Medvedev, exortou aos preparativos para um grande reequipamento das Forças Armadas, para que em 2017-2018 o país esteja em condições de dar uma resposta à sistema de defesa antimissil norte-americana situada na Europa. A Rússia exige dos EUA garantias jurídicas de que a referida DAM não alvejará Moscou. Mas Washington recusa-se a fornecê-las, limitando-se a asseverações verbais.

Neste contexto, o Presidente anunciou uma série de passos russos. Por exemplo, foi posta em funcionamento uma estação radar em Kaliningrado e foi reforçada a proteção de instalações estratégicas nucleares russas. Além disto, foi formulada a tarefa de desenhar medidas visando destruir sistemas de informação e comando da DAM. Mísseis balísticos estratégicos, fornecidos às tropas de mísseis estratégicos e à Força Naval, foram dotados de novos aparelhos destinados a “perfurar” a DAM e novas ogivas de alta eficiência.

Se os EUA continuarem a instalar seu sistema global de DAM em torno da Rússia, Moscou reservar-se-á o direito de desistir de novos passos no domínio de desarmamento e até mesmo de abandonar o Tratado de Armamentos Estratégicos Ofensivos.

Mossad, Blackwater e a CIA lideram as operações em Homs, na Síria

Mossad, Blackwater e a CIA lideram as operações em Homs, na Síria

E-mailImprimirPDF

06 MARÇO 2012
CLASSIFICADO EM INTERNACIONAL – IMPERIALISMO

imagemCrédito: 1.bp.blogspot

Israa Al-Fass

“A crise está no fim” não é mais uma declaração de alívio feita por analistas políticos, quando a crise está realmente próxima de seu fim. Baba Amro agora está sob controle do exército sírio… e por isso grupos armados fugiram através das fronteira libanesa simulando uma retirada “tática”

Tradução Flávio Furtado de Farias

Fonte: http://www.almanar.com.ib

Fontes bem informadas disseram ao site Al-Manar que aproximadamente, 700 atiradores árabes e ocidentais se renderam em Baba Amro, acrescentando que “revelações enormes e críticas serão realizadas nos próximos dias… tais como os tipos de armas apreendidas, bem como as táticas militares utilizadas pelos grupos armados, e os lados que supervisionavam as operações”.

As fontes ainda garantiram ao site de notícias que a operação de segurança em Homs vai acabar no máximo em cinco a oito dias.

Por sua vez, o especialista sírio em assuntos estratégicos, Salim Harba apontou que as organizações de grupos armados bem como sua estrutura de comando foram removidas do bairro Baba Amro, com um mínimo de mortes civis e de militares, e que na área concentravam-se principalmente homens armados.

Falando ao site Al-Manar, Harba disse que “os homens armados capturados eram de nacionalidade árabe, inclusive do Golfo, do Iraque e do Líbano… entre eles haviam agentes secretos do Catar e combatentes não-árabes do Afeganistão, Turquia e alguns países europeus, como a França.

“O exército sírio também descobriu túneis e equipamentos”, acrescentou, salientando que “armas israelenses, europeias e americanas avançadas, ainda não testadas em seus países produtores, além de granadas israelenses, binóculos noturnos e sistema de comunicação foram confiscados pelas forças de segurança”.

Harba prosseguiu afirmando que “as estações de comunicação foram estabelecidas na fronteira libanesa para supervisionar as operações militares em Baba Amro, e para garantir o contato entre os comandantes de campo e um escritório de coordenação liderado por membros da informação na capital do Qatar Doha.”

Ele esclareceu que “a fuga de jornalistas britânicos de Homs, através das fronteiras do Líbano-Síria foi o resultado desta coordenação”.

Ao mesmo tempo, o especialista em estratégia sírio revelou que “as estações de comunicação foram operadas por libaneses, alguns dos quais membros do bloco parlamentar do Futuro”, e considerou que “trabalharam para transformar a região de Wadi Khaled em um departamento estratégico para Baba Amro.”

Além disso, Salim Harba revelou ao site Al-Manar que “um escritório de coordenação foi criado em Qatar com patrocínio golfo-americano. O escritório inclui agentes da inteligência americana, francesa e do Golfo, especialmente de Qatar e da Arábia Sáudita, bem como agentes da CIA, Mossad e Blackwater e os membros do Conselho Transitório da Síria”.

“O Qatar também fez acordos com empresas israelenses e americanos para armar os grupos armados, e países do Golfo financiaram os acordos”, acrescentou.

O especialista sírio assinalou que “a importância da operação de segurança em Homs é devida às altas expectativas que os lados regionais e internacionais tinham das gangues armadas em Baba Amro… eles queriam transformar Homs em uma nova Benghazi”.

Indicando que a operação foi executada com elevado profissionalismo e precisão, Harba assegurou que os documentos serão expostos no momento certo.

“A autoridade não revelará tudo o que tem agora… as forças de segurança sírias têm documentos e confissões que poderiam prejudicar todos os que conspiraram contra a Síria, e poderiam trazer alterações na segurança e política, não apenas no plano interno sírio, mas também em nível regional”, assegurou.

No mesmo contexto, Harba considerou que todas as conferências e reuniões a que ele se referia como os “inimigos da Síria” se destinavam a preparar o caminho para uma iniciativa norte-americana sob uma bandeira “humanitária”.

Ele concluiu: “No final, os EUA enviarão para a iniciativa russa, depois que perceberam que os confrontos resultariam em sua derrota, e que o regime sírio ainda é forte o suficiente para lidar com qualquer conspiração.”

Texto enviado por Nelba Nycz

http://www.iranews.com.br/noticias.php?codnoticia=7674

retirado de PCB.org.br